"08 Maio 2013, 15:13 por Simon Johnson
Há duas narrativas opostas sobre os recentes esforços da reforma financeira e os perigos que os bancos de grande dimensão colocam actualmente em todo o mundo. Uma narrativa é errada, a outra é assustadora.
No centro da primeira narrativa, preferida pelos executivos do sector financeiro, está a visão de que todas as reformas necessárias já foram adoptadas (ou serão em breve). Os bancos têm menos dívida em relação aos seus níveis de capital do que tinham em 2007. As novas regras para limitar o âmbito das actividades dos bancos estão a ser aplicadas nos Estados Unidos e, em breve, farão parte da legislação do Reino Unido — e seguir-se-á a Europa continental. Os proponentes desta visão também advogam que os megabancos gerem melhor os riscos do que o faziam antes da crise financeira global que eclodiu em 2008.
Na segunda narrativa, os maiores bancos do mundo continuam a ser demasiado grandes para gerir e têm fortes incentivos para se empenharem na tomada de riscos excessivos que colapsou as economias. No ano passado, as perdas de “trading” provocadas pelo “London Whale” no JPMorgan são um exemplo disso. E, de acordo com os defensores desta narrativa, quase todos os grandes bancos apresentam sinais de má administração crónica.
Ainda que o debate em torno dos megabancos parece, por vezes, técnico, de facto, é muito simples. Coloca-se a questão: se as instituições financeiras monstruosas tiverem problemas, isso é um grande problema para o crescimento económico, desemprego e por aí em diante? Ou, sem rodeios, pode o Citigroup ou um banco de dimensão similar na Europa, ficar em apuros e tropeçar novamente para a quase falência sem atrair algum tipo de apoio do governo ou do banco central (seja um apoio transparente ou um pouco disfarçado)?
Os Estados Unidos deram um passo na direcção certa com o Título II da reforma financeira de Dodd-Frank, em 2010, e que reforçou os poderes de resolução da Federal Deposit Insurance Corporation (FDIC). E a FDIC tem desenvolvido alguns planos plausíveis especificamente para lidar com as instituições financeiras domésticas (trabalho no Comité de Consultoria para a Resolução Sistémica da FDIC; todas as visões aqui demonstradas são unicamente da minha responsabilidade).
Mas, um grande mito espreita no coração do argumento da indústria financeira de que tudo está bem. Os poderes de resolução da FDIC não vão funcionar para as grandes e complexas instituições financeiras transfronteiriças. A razão é simples: a lei dos Estados Unidos pode criar uma autoridade de resolução que funciona apenas dentro das fronteiras nacionais. Abordar a falência potencial numa empresa como o Citigroup poderia requerer um acordo transfronteiriço entre os governos e todos os organismos responsáveis.
Nos encontros informais das recentes reuniões de Primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI), em Washington, tive a oportunidade de falar com altos responsáveis e os seus assessores que representavam vários países, incluindo os da Europa. Coloquei a todos a mesma questão: quando teremos um quadro de resolução de âmbito transfronteiriço?
Tipicamente, as respostas oscilaram de “não durante as nossas vidas” e “nunca”. Novamente, a razão é simples: os países não querem comprometer a sua soberania ou atar as suas mãos de alguma forma. Os governos querem ter a capacidade de decidir sobre a melhor forma de proteger os interesses dos seus países quando surge uma crise. Nenhum quer assinar um tratado ou outra forma de pré-compromisso (quem menos deseja assumir este compromisso é uma maioria do Senado dos Estados Unidos, que é quem deve ratificar um tratado desta natureza).
Como Bill Dudley, presidente da Reserva Federal de Nova Iorque, afirmou recentemente, usando a linguagem delicada dos responsáveis dos bancos centrais, “o impedimento para uma resolução transfronteiriça ordenada ainda precisa de ser completamente identificado e desmantelado. Isto é necessário para eliminar o chamado problema do ‘demasiado grande para falir’ ”.
Tradução: uma resolução ordenada para os megabancos mundiais é uma ilusão. Enquanto permitirmos que existam bancos transfronteiriços ou perto da sua escala actual, os nossos líderes políticos serão incapazes de tolerar a sua falência. E, porque estas grandes instituições financeiras são por definição “demasiado grandes para falir”, podem emprestar mais barato do que de outra forma seria possível. Pior, têm quer o motivo quer a oportunidade para crescer e serem ainda maiores.
Esta forma de apoio do governo representa um grande subsídio implícito para os grandes bancos. É uma estranha forma de subsídio, sem dúvida, mas isso não faz com que seja menos penalizador para o interesse público. Pelo contrário, como o apoio implícito do governo aos bancos “demasiado grandes para falir” aumenta com a quantidade de risco que eles assumem, este apoio pode estar entre os mais perigosos subsídios que o mundo alguma vez viu. No final, mais dívida (em relação ao capital) significa um pagamento superior quando as coisas correm bem. E, quando as coisas correm mal, torna-se um problema dos contribuintes (ou problema de alguns governos internacionais e dos seus contribuintes).
Que outra parte do mundo empresarial tem a capacidade de conduzir a economia mundial para a recessão, como os bancos fizeram no Outono de 2008? E quem mais tem um incentivo para maximizar a quantia de dívida que emite?
O que as duas narrativas sobre a reforma financeira têm em comum é que nenhuma tem um final feliz. Ou colocamos um limite significativo à dimensão das nossas maiores instituições financeiras, ou devemos preparar-nos para a explosão económica, impulsionada pela dívida, que está para vir.
Simon Johnson é professor do MIT Sloan School of Management."
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