quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Sobre o Estatuto do Gestor Público


O Decreto-Lei 8/2012, publicado hoje em Diário da República, acaba com alguns privilégios dos gestores públicos e obriga a nomeações mais transparentes.

Entre as novas regras está a obrigatoriedade da proposta dos membros do Governo, responsáveis pela área das finanças e pelo respectivo sector de actividade, ser acompanhada pela avaliação, não vinculativa, do currículo académico e profissional do designado, e da adequação das suas competências ao cargo de gestor público, realizada pela Comissão de Recrutamento e Selecção para a Administração Pública.

Tem de ser celebrado um contrato de gestão, no prazo de três meses contado a partir da data da designação do gestor público, entre este, os titulares da função accionista e o membro do Governo responsável pelo respectivo sector de actividade, sob pena de ser nulo o acto de nomeação.
E, só no caso de cumprirem, pelo menos, 1 ano de serviço, é que estes gestores terão direito a indemnização com o limite de 12 meses do vencimento base.

Os gestores públicos vão ter um vencimento mensal com um limite indexado ao vencimento do primeiro-ministro, ou seja, 5300 euros brutos por mês.
Terão ainda um abono mensal, pago 12 vezes ao ano, para despesas de representação no valor de 40% do respectivo vencimento.
Nas empresas dos sectores especiais — as que produzam bens e serviços mercantis, incluindo serviços financeiros, em regime de concorrência no mercado —, os gestores podem optar entre a indexação ao salário do primeiro-ministro ou a remuneração média (actualizada) dos últimos três anos do lugar de origem.
Nos casos em que seja exercido este direito de opção, os gestores não auferem o abono mensal para despesas de representação nas situações em que o respectivo vencimento mensal ultrapasse o do primeiro-ministro.

Poderão ser atribuídos prémios de gestão no final do exercício ou do mandato, com o limite de metade da remuneração anual auferida. E durante a vigência do Programa de Assistência Económica e Financeira (PAEF) não há lugar à atribuição de prémios de gestão.

Não é permitida a utilização de cartões de crédito e outros instrumentos de pagamento pelos gestores públicos para pagar despesas ao serviço da empresa. Nem o reembolso de quaisquer despesas que caiam no âmbito do conceito de despesas de representação pessoal.
O valor máximo das despesas relativas a comunicações — telefone móvel, telefone domiciliário e internet — é fixado por deliberação em assembleia geral, no caso das sociedades anónimas, ou por despacho, publicado no Diário da República, do membro do Governo responsável pela área das finanças, no caso das entidades públicas empresariais.

Do mesmo modo será fixado o valor máximo das viaturas de serviço afectas aos gestores públicos.
O valor máximo de combustível e portagens, afecto mensalmente às viaturas de serviço, é fixado em 25% do valor do abono mensal para despesas de representação.

As alterações introduzidas pelo presente diploma ao Estatuto do Gestor PúblicoDecreto-Lei 71/2007 — produzem efeitos com a entrada em vigor do Orçamento do Estado para 2012 e aplicam-se aos gestores públicos designados, ou a designar, para órgãos de gestão ou administração de empresas públicas.
Em relação aos gestores públicos actualmente no exercício de funções, o direito de opção pela remuneração média dos últimos três anos reporta-se ao período imediatamente anterior ao início de funções na sua actual empresa pública.


Esta revisão do Estatuto do Gestor Público surge numa altura em que 18 empresas públicas aguardam pela nomeação de novos órgãos sociais, porque os conselhos de administração já terminaram o mandato (3 anos, renováveis), sem que tenham sido substituídos.


Actualização em 25 de Janeiro:

Pela Declaração de Rectificação 2/2012, publicada em 25 de Janeiro, todos os gestores podem optar pelo vencimento do lugar de origem, não podendo exceder o vencimento mensal do Primeiro-Ministro no caso dos sectores gerais.


Ao vergar-se às exigências do mais poderoso lobby deste país — o dos gestores —, o governo incorreu inadvertidamente numa inconstitucionalidade formal.
Segundo Pedro Melo, advogado da PLMJ, "esta não é uma verdadeira declaração de rectificação, mas uma alteração do decreto-lei, já que introduz uma nova norma", portanto "levanta questões de constitucionalidade formal". Como há uma modificação do diploma, no sentido de alargar a opção por salários de origem a todos os gestores públicos, "teria de ser aprovada em Conselho de Ministros" e não apenas assinada pela directora do centro jurídico da Presidência do Conselho de Ministros.
De acordo com o art.º 281 da Constituição, entre as entidades que podem requerer a declaração de inconstitucionalidade ao Tribunal Constitucional estão o Presidente da República, o presidente da Assembleia da República, o primeiro-ministro, o provedor de Justiça, o procurador-geral da República e um décimo dos deputados.

No entanto, este advogado concorda com "a filosofia subjacente ao estatuto remuneratório do gestor público. O diploma tem a combinação de duas perspectivas: encontrar gestores para as empresas públicas com a qualidade que se deseja, introduzindo ao mesmo tempo a limitação ao salário do primeiro-ministro no caso dos sectores gerais".


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Um comentário pertinente lido no PÚBLICO:

JJ, Lisboa. 18.01.2012 15:07
40% de "despesas de representação" são uma delícia
Esta é a maior burla institucionalizada nos sistemas remuneratórios dos altos cargos da administração, incluindo os dos membros do Governo.
Não se trata de despesas de representação mas de subtrair à tributação uma verba que é de 40% da remuneração base do Sr. PM., paga 12 vezes por ano. Não tiveram a coragem de escrever 14! Para estes não há crise!
Havia uma maneira muito fácil — se não houvesse o intuito de beneficiar os interessados — que era a de dizer que a remuneração base seria acrescida de uma "verba para despesas de representação, a comprovar documentalmente, que poderá ir até 40% da remuneração". Não se dizendo desta forma, são 40% 'limpos', metidos à la poche, sem contribuírem em nada nem para os impostos nem, ao menos, para 'activarem o comércio' se fossem obrigatoriamente comprovados por facturas.


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