sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Tempos de mudança na Madeira - II


O Programa de Ajustamento Económico e Financeiro (PAEF) da Madeira, hoje divulgado por Alberto João Jardim, é um conjunto de 73 medidas, com dezenas de alíneas, que começam assim: “O GRM aceita... " "O GRM reconhece... " "O GRM compromete-se... ”

Veja-se este excerto com as quatro primeiras medidas:



Mas o Governo Regional da Madeira (GRM) aceita, reconhece ou compromete-se a fazer o quê?
Pura e simplesmente a aplicar na região autónoma da Madeira as medidas que o governo de José Sócrates, o PSD e o CDS acordaram com a troika FMI/CE/BCE no Programa de Ajustamento Económico e Financeiro (PAEF) da República Portuguesa!

Tal como no continente, os ajustamentos serão feitos, maioritariamente, através de corte de despesas, exactamente 522 milhões de euros, enquanto por via das receitas será 127 milhões de euros.

Do lado da despesa, os cortes passam por:
  • Aplicação das medidas previstas no OE 2012 às remunerações dos trabalhadores em funções públicas, incluindo o sector público empresarial, comprometendo-se a não aplicar medidas compensatórias que aumentem a despesa.
  • Redução anual do número de trabalhadores em, pelo menos, 2% tal como o continente terá de fazer.
  • Suspensão dos subsídios de férias e de Natal dos trabalhadores em funções públicas, incluindo o sector público empresarial, nos termos do OE 2012.
  • Revogação do subsídio de insularidade a partir de 1 de Fevereiro de 2012.
  • Redução de 30% para 15% do subsídio pelo exercício de funções públicas na Ilha do Porto Santo.
  • Redução das despesas com prestações sociais em espécie em, pelo menos, 3,9 milhões de euros.

Do lado da receita:
  • As taxas de IRS e de IRC serão iguais às de Portugal continental, a partir de 1 de Janeiro de 2012.
  • As taxas de IVA vão aumentar a partir de 1 de Abril de 2012, reduzindo-se o diferencial face às taxas do continente para 1 ponto percentual.
  • Não haverá portagens mas as taxas do imposto sobre produtos petrolíferos serão superiores em, pelo menos, 15% face às do continente.
  • Haverá um programa de privatizações sendo alienadas em 2012 as participações do GRM nas Sociedades Anónimas Desportivas, na Cimentos Madeira e na Empresa de Electricidade da Madeira, de modo a garantir uma receita de, pelo menos, 25 milhões de euros.
  • Encerramento das empresas públicas, eventualmente com integração na administração regional directa, cuja empresarialização já não se justifica.
  • Aumento do tarifário dos transportes públicos em 15%, em média.
  • Actualização das rendas sociais.
  • Não concretização de novas parcerias público-privadas até que seja finalizada a revisão das PPP existentes e as reformas propostas.
    A avaliação das PPP em curso no âmbito do PAEF abrangerá a Vialitoral e a Viaexpresso, renegociando os contratos vigentes, se tal for favorável.

Saúde:
  • Aplicação de um tarifário que permita a racionalização da despesa no Serviço Regional de Saúde.
  • Implementação da prescrição electrónica de medicamentos, de meios de diagnostico e terapêutica.
  • Estabelecimento de regras de prescrição baseadas nas orientações nacionais e internacionais de prescrição e boa prática clínica.

Em conclusão, o arquipélago da Madeira e de Porto Santo deixa de ser uma república das bananas e passa a orientar-se pelo sistema de controlo rigoroso exigido a Portugal. Que os madeirenses e os porto-santenses sejam bem-vindos!

Este plano de ajustamento vai permitir à Região Autónoma da Madeira receber 1,5 mil milhões de euros de financiamento do Governo da República, a uma taxa de juro igual à da troika e com 15 anos para pagar o empréstimo.
A amortização de capital só começa daqui a quatro anos e o empréstimo vence em 2031.

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À sombra protectora do homem dos "tabus, das cumplicidades e das conspirações palacianas" muitos fruíram, e querem continuar a fruir, rendas e privilégios obscenos.
Demonstram-no a peregrinação de Fernando Ruas a Belém, aquando da apresentação do Documento Verde às autarquias, e o "comovente" respeito de Alberto João Jardim pelo presidente durante as negociações do PAEF da Madeira.
É certo que a recente polémica das reformas fizeram-lhe perder poder de manipulação, mas os seus adeptos vão esforçar-se por lhe reconstruir a credibilidade agitando o espectro do autoritarismo do Governo. E haverá sempre jornalistas que mordem o anzol.
Assim Passos Coelho queira e saiba aproveitar este tempo de calmaria na intrigalhada política de que o nosso belo País vai desfrutar enquanto tão funesta personagem e a sua corte não readquirirem influência.

Se deixarem Vítor Gaspar tratar as dívidas da Administração Local que já ascendem a mais de 4,5% do PIB — 7,9 mil milhões de euros —, algo que não preocupa os autarcas, com o mesmo rigor, firmeza e justiça que pôs nesta difícil negociação com a Região Autónoma da Madeira, o País poderá acalentar a esperança de dobrar o cabo das tormentas aonde descaiu após 37 anos de deriva ao sabor das correntes.


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