quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

Putin anuncia operação militar no Donbass


Numa declaração televisiva, o presidente da Federação Russa acaba de anunciar a realização de uma operação militar especial no território das repúblicas do Donbass cuja independência foi reconhecida pelo parlamento russo na passada terça-feira:


"As repúblicas populares de Donbass recorreram à Rússia com um pedido de ajuda. A este respeito, de acordo com o artigo 51, parte VII da Carta da ONU, com a decisão do Conselho da Federação da Rússia e em conformidade com os tratados ratificados pela Assembleia Federal, em 22 de Fevereiro de 2022, de amizade e assistência mútua com as Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, decidi realizar uma operação militar especial.
O objectivo é proteger as pessoas que foram submetidas a torturas e genocídio pelo regime de Kiev durante 8 anos. Para isso, visaremos a desmilitarização e a desnazificação da Ucrânia e processaremos aqueles que cometeram inúmeros massacres, inclusive contra os cidadãos russos."

Putin sublinhou que a Rússia não planeia ocupar a Ucrânia, mas esclareceu que a resposta de Moscovo seria "instantânea" se alguém tentasse impedir esta operação militar especial.


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O artigo 51 do capítulo VII da Carta da ONU, referido por Putin, prevê o direito dos países de se empenharem na legítima defesa, incluindo legítima defesa colectiva, contra um ataque armado.

Este artigo foi citado pelos Estados Unidos da América para justificar a legalidade da sua intervenção na Guerra do Vietname entre 1959 e 1973: "Os Estados Unidos argumentaram de forma convincente que, embora o Vietname do Sul não seja um Estado soberano independente ou membro das Nações Unidas goza, no entanto, do direito de autodefesa, e os Estados Unidos têm o direito de participar na sua defesa colectiva." (The Charge of Criminal Conduct in Vietnam B.1. §4).

Agora é a Rússia que invoca o artigo 51 para justificar uma operação militar. E numa região onde a população russa é maioritária. No entanto, o artigo 51 é considerado de difícil aplicação com justeza na vida real.

Terminada a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) conseguiu estabelecer regimes socialistas, não só em parte da Alemanha, mas também em todos os países europeus do Leste. Face a esta ameaça, os países europeus ocidentais e os Estados Unidos criaram uma organização militar, a NATO, em Abril de 1949.

Com a integração da Alemanha Ocidental na NATO, em Maio de 1955, foi a vez da URSS e aliados socialistas se sentirem ameaçados e criarem uma aliança militar — o Pacto de Varsóvia.

O decorrer do tempo, porém, veio demonstrar que economias estatizadas acabam por definhar. O Pacto de Varsóvia desfez-se e a União Soviética implodiu em Dezembro de 1991.

Assinatura dos Acordos de Belovezh — que declararam a cessação da URSS e estabeleceram a Comunidade de Estados Independentes (CEI) como sucessora — pelos líderes de três das quatro repúblicas que tinham assinado o Tratado de 1922 que criou a URSS: todos sentados, o presidente ucraniano (segundo à esquerda), o presidente do parlamento bielorrusso (terceiro à esquerda) e o presidente russo Boris Yeltsin (segundo à direita). Bielorrússia, em 8 de Dezembro de 1991.


França, Alemanha e Itália são economias fortes que podiam disponibilizar fundos para financiar o desenvolvimento das economias dos países europeus do bloco de Leste. Não só estes, mas até os países — Estónia, Letónia e Lituânia — que se declararam independentes em relação à União Soviética solicitaram a entrada na União Europeia. Serem os Estados Unidos a arcar com despesas militares desses países foi um aliciante para começarem também a aderir à NATO a partir de 1997.
Em 1997, três países do antigo Pacto de Varsóvia — Polónia, República Checa e Hungria — foram convidados, convertendo-se em membros da NATO em 1999. Eslováquia, Roménia, Bulgária, três repúblicas socialistas soviéticas — Estónia, Letónia e Lituânia — e Eslovénia aderiram na cimeira de Istambul de 2004. Albânia e Croácia em 2009, o Montenegro em 2017 e a Macedónia do Norte em 2020. A NATO passou de 16 para 30 membros.
Repúblicas que pertenciam à URSS: na Europa, Estónia, Letónia, Lituânia (passaram para a NATO), Bielorrússia, Moldávia e Ucrânia; na Ásia, Geórgia, Azerbeijão e Arménia.
(Ver comparação das forças militares da Rússia e dos Estados Unidos actualizada; ver valores das forças militares da maioria dos Estados Membros da NATO actualizados)


A cimeira de Bucareste, em Abril de 2008, foi a cereja em cima do bolo para a NATO, de tal modo que comentou efusivamente na declaração final (§23): "A NATO congratula-se com as aspirações euro-atlânticas da Ucrânia e da Geórgia para a adesão à NATO. Concordámos hoje que esses países se tornarão membros da NATO".

Acontece que, se este desiderato se concretizasse, a Rússia ficava com tropas, tanques e aviões de guerra da NATO em número muito superior ao das suas forças armadas na fronteira europeia, ou seja, excepto na fronteira finlandesa e bielorrussa, ficava sitiada.

Quando a União Soviética instalou mísseis em Cuba, em 1962, os Estados Unidos protestaram, e com razão, apesar de existir mais de 140 km de mar entre os dois países, além de disporem da Base Naval de Guantánamo na ilha. E os soviéticos tiveram de retirar os mísseis.

Em Novembro de 2013, teve início em Kiev, a capital da Ucrânia, uma onda de manifestações e protestos — Euromaidan (praça do Euro) — desencadeados pela decisão do governo de não assinar o acordo de associação Ucrânia-União Europeia e preferir estreitar os laços com a Rússia e a União Económica da Eurásia.
Os confrontos com a polícia deram origem à formação de milícias paramilitares de extrema-direita que preferiam a integração do país na rica União Europeia. Em Fevereiro de 2014, estes grupos ocuparam e ergueram barricadas na Maidan (praça central) de Kiev, efectuaram um golpe de Estado e procederam à eleição de um governo por votação de braço no ar.

O relacionamento com a Rússia deteriorou-se, não obstante ambos os países terem tido origem na Kievan Rus' (Rússia de Kiev) — uma federação de povos eslavos orientais, bálticos e fínicos no leste e norte da Europa, entre 862 e 1240, até à invasão mongol comandada por Batu Khan, neto de Gengis Khan — que teve Kiev como capital.

Kievan Rus' de 1054 a 1132. É o embrião histórico da Rússia, Bielorrússia e Ucrânia que recebeu a capital Kiev.


O pomo da discórdia foi a península da Crimeia. Conquistada pelo Império Russo em 1783, aí foram instaladas as bases navais da Frota do Mar Negro em 1790. Após a Guerra Civil Russa (1917–1921) ficou integrada na república socialista soviética Russa até que, inopinada e ilegalmente, Nikita Khrushchev decidiu transferi-la para a sua congénere Ucraniana, em 1954.

A seguir à implosão da União Soviética, em Maio de 1992, o parlamento da Crimeia adoptou uma declaração de independência (pág.194-195), anulada ao fim de poucos dias pelo parlamento ucraniano por entre ameaças de que a península ou seria ucraniana ou despovoada.
Em 1997, o ambiente político tornou-se mais favorável e foram assinados vários Tratados entre a Ucrânia e a Rússia que garantiam à Rússia o uso das suas Bases Navais na Crimeia. Estes acordos seriam postos em causa se a Ucrânia aderisse à NATO conforme prometido na cimeira de Bucareste de 2008.

Com mais de 75% da população a ocidente dos Montes Urais, a Rússia possui o maior e o mais populoso território do continente europeu, mas tem acesso difícil ao oceano Atlântico: a costa setentrional, banhada pelo oceano Glacial Ártico, está gelada quase todo o ano e a saída pelo mar Báltico é estrangulada entre a Dinamarca e a Suécia. As bases navais do Mar Negro são essenciais.

Cercada por terra e por mar pela NATO, a Rússia terá começado a sentir-se a rã dentro de uma panela com água a aquecer em fogo lento.

Se a Euromaidan criou o problema, então ao eliminar temporariamente a legalidade, permitiu resolver o imbróglio. Em Março de 2014, a Rússia invadiu a Crimeia, criando condições para a realização de um referendo. A população da Crimeia é maioritariamente russa, logo o referendo não só concedeu a independência à Crimeia — num processo que a Rússia considera análogo à independência do Kosovo (2008) em relação à Sérvia, após os ataques aéreos da NATO, em 1999 —, mas também permitiu a sua incorporação na Rússia com o estatuto de República da Crimeia.

Percentagem da população, por oblast (província), que tem o russo como língua materna.
Caro leitor, se dispuser de uma hora, assista a esta excelente palestra do professor John Mearsheimer.

Nas províncias do Donbass, a maioria da população também tem o russo como língua materna e foi esmagada pelo crescimento do nacionalismo ucraniano. Tratados como uma minoria étnica e linguística uma lei de Julho de 2019 obrigou a conversão das escolas de língua russa para língua ucraniana, até Setembro de 2020, mas concedeu mais três anos às minorias polacas, húngaras e romenas ocidentais para se adaptarem ao ucraniano como língua de instrução , revoltaram-se contra as tentativas de discriminação por parte de líderes políticos de extrema-direita e lutam há 8 anos pela independência, numa guerra com 13.000 mortos, contra as forças armadas ucranianas.

Os Acordos de Minsk de 2015, assinados pelo Grupo de Contacto Trilateral sobre a Ucrânia — composto pela Ucrânia, Rússia e a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) —, impuseram um cessar-fogo e previam a realização de eleições locais em Donetsk e Lugansk.
Aquando das eleições locais na Ucrânia, em Outubro de 2015, os líderes dessas regiões separatistas tentaram implementá-las, mas o Grupo aconselhou o seu adiamento para serem adequadamente preparadas, tendo pedido à Rússia para exercer a sua influência. Assim aconteceu, sendo as eleições sucessivamente adiadas até que os líderes locais deram o prazo de 2017 para eleições, ou sob os acordos de Minsk ou de forma independente.
As eleições acabaram por se realizar em Novembro de 2018, saindo vitoriosos os líderes separatistas. Então a Ucrânia declarou que era impossível implementar os acordos de Minsk.

Há cerca de três meses, a Rússia exigiu que a NATO rescindisse o compromisso de 2008 com a Ucrânia e a Geórgia — duas repúblicas da União Soviética até Dezembro de 1991 — de que um dia se tornariam membros e disse que aquela aliança militar devia prometer não implantar armas em países que fazem fronteira com a Rússia que possam ameaçar a sua segurança. A resposta da NATO foi um retumbante não. Obviamente os russos tinham de aventurar-se a saltar da panela antes de ficarem cozidos.



terça-feira, 1 de fevereiro de 2022

O INMLCF informa que morte de criança de 6 anos não foi devida à vacinação contra a Covid-19



No passado dia 17 de Janeiro, o Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte (CHULN) divulgou um comunicado sobre o óbito, ocorrido a 16 de Janeiro, “de um menino de seis anos com teste positivo para SARS-Cov-2, que deu entrada no Hospital de Santa Maria no dia anterior com um quadro de paragem cardiorrespiratória”.
A criança tinha a primeira dose da vacina contra a Covid-19, tendo o CHULN notificado o caso ao Infarmed e à Direção-Geral da Saúde“, prosseguia o comunicado.

A vacinação terá ocorrido cerca de uma semana antes, aquando a vacinação do grupo das crianças dos 5 aos 11 anos.

Por este facto, o centro hospitalar notificou o Infarmed e a Direcção-Geral da Saúde, o que foi confirmado pelo Infarmed: “Confirmamos que recebemos a notificação de suspeita de reacção adversa no decorrer do dia de hoje [segunda-feira, 17] e que a mesma se encontra a ser tratada pelo Infarmed em conjunto com a Unidade Regional de Farmacovigilância de Lisboa, Setúbal e Santarém.
O Infarmed acrescentou que estava a recolher “dados adicionais por parte do notificador para análise e avaliação da imputação de causalidade, uma vez que, não sendo a aparente relação temporal o único determinante na avaliação da causalidade, é necessário proceder à recolha de toda a informação clínica”.

Esta análise tem de preceder a comunicação ao sistema de gestão e análise de informações sobre suspeitas de reações adversas a medicamentos — o EudraVigilance —, que foram autorizados ou estão em estudo em ensaios clínicos no Espaço Económico Europeu.

O Ministério Público, como sempre acontece no caso de óbitos de crianças, abriu um inquérito.

Agora o Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (INMLCF) acaba de divulgar o seguinte comunicado (o negrito é da minha responsabilidade):

"O Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses informa terem sido concluídos os exames complementares laboratoriais e ter sido enviado para o Ministério Público, na presente data, o relatório da autópsia realizada no dia 18 de janeiro à criança de 6 anos que deu entrada no Hospital de Santa Maria.

Com o conhecimento e a anuência da Magistrada do Ministério Público titular do processo, informa-se que a morte da criança não foi devida à vacinação contra a Covid-19.

Esta informação foi já transmitida à família da criança.

Em respeito pela família e pela reserva da intimidade da vida privada, o INMLCF não divulga outras informações de natureza clínica.
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A morte desta criança está a preocupar outros pais que já vacinaram ou tencionavam vacinar os seus filhos contra a covid-19 porque desconhecem as circunstâncias que precederam o desfecho fatal.

Uma professora que dava aulas de teatro ao Rodrigo, no âmbito das actividades extra-curriculares da EB1 São João de Deus que pertence ao Agrupamento de Escolas D. Filipa de Lencastre, revelou que a criança lhe disse "ando cansado desde que tomei a vacina", na semana anterior à sua morte. Foi prontamente desmentida pela Associação de Pais e Encarregados de Educação daquele agrupamento — que, obviamente, não estiveram em contacto com a criança naquela semana — e silenciada com a abertura de um inquérito interno.

Agora o relatório da autópsia foi enviado para o Ministério Público, mas não é revelado se uma cópia foi entregue aos pais do Rodrigo. Resta a esperança de que sim e de que os pais do menino, passado o período doloroso do luto, reconheçam que os pais das outras crianças têm necessidade de conhecer a causa da morte para, eventualmente, apaziguarem as suas mentes.

Em autoridades de saúde, que não têm primado pela verdade e transparência durante esta pandemia, é que é difícil confiar.
Ainda não nos esquecemos que a directora-geral da saúde dizia, enquanto houve uma enorme escassez de equipamentos de protecção individual nos hospitais, que era perigoso usar máscaras cirúrgicas porque as pessoas contaminavam as mãos ao tocarem nelas e depois contaminavam tudo em redor; logo que a escassez terminou, passou a ser obrigatório usar máscaras cirúrgicas.