quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Declaração de Vítor Gaspar de 3 de Outubro de 2012


Eis a declaração apresentada por Vítor Gaspar, hoje, na íntegra:



"Quero destacar que Portugal regressou hoje ao mercado de obrigações. Hoje mesmo, realizámos uma operação de troca de dívida que é, a todos os títulos, um enorme sucesso. Marca de forma inequívoca o regresso da República Portuguesa ao mercado.
Resolvemos a incerteza sobre o financiamento durante o ano de 2013, ao trocar 39% do montante em dívida de Obrigações do Tesouro com maturidade em Setembro de 2013 por dívida [3757 milhões de euros a 3,35%] que se vence em Outubro de 2015, mais do que um ano após o final do programa de ajustamento.
Ganhámos tempo precioso para consolidar o nosso programa de ajustamento já que a data em que voltamos a ter uma amortização de montante significativo é Junho de 2014.
A operação de hoje foi realizada em condições de mercado, a uma taxa de juro de 5,12%. Isto é equivalente a emitir dívida no mercado a um prazo de 3 anos, muito além dos 18 meses dos bilhetes do Tesouro que já por duas vezes conseguimos colocar com crescente sucesso e o montante colocado foi muito superior. (...) Representa um sinal claro de normalização do mercado secundário de dívida pública portuguesa.

O caso da Irlanda é comparável. O seu regresso ao mercado da dívida foi marcado pelo reinício da emissão de bilhetes do Tesouro — que, recorde-se, Portugal nunca interrompeu — mas sobretudo pelas realização de operações de troca de dívida de características em tudo semelhantes à que hoje realizámos. Apesar de o nosso programa [de ajustamento] se ter iniciado mais tarde, estamos a encurtar a distância que nos separa de outro relevante caso de sucesso no ajustamento dentro da Zona Euro. E fazemo-lo a taxas sustentáveis que não comprometem o nosso futuro.

A obrigação [9586 milhões de euros] que se vence em Setembro da 2013 foi emitida em Maio de 1998 a uma taxa de juro de 5,45%. Esta data tem um grande simbolismo: o BCE estava então a preparar-se para o começo da política monetária única, que começou em Janeiro de 1999. A emissão de uma obrigação a 15 anos a uma taxa de 5,45% abria possibilidades de financiamento sem precedentes para Portugal. Somos hoje, em crise, capazes de refinanciar esta operação.

Continuaremos assim a construir a nossa curva de rendimentos, passo a passo, de forma a retomar com sucesso o nosso financiamento em condições normais de mercado. A credibilidade e a confiança levam tempo a construir. Exigem persistência, esforço e sacrifício. A credibilidade que levou anos a construir pode ser perdida num momento.
Os acontecimentos e desenvolvimentos em Portugal são seguidos de perto pelos nossos parceiros e pelos investidores internacionais. A nossa capacidade de ajustamento e a coesão nacional são objectos de admiração: não podemos desperdiçar estes activos preciosos.
(...)
A verdade é que este ajustamento é um ajustamento orçamental sem precedentes. Deste modo, aproximadamente dois terços do esforço orçamental requerido até 2014 estarão concluídos até ao final deste ano de 2012. Este resultado foi conseguido através de um total de medidas de consolidação orçamental na ordem dos 10% do PIB, aproximadamente 17 mil milhões de euros, sendo 62% deste esforço realizado do lado da despesa.
A diminuição de despesa conseguida em 2011 e 2012 tem uma enorme dimensão. Nunca nenhum governo em Portugal conseguiu tal redução. Recordo que, em 2010, a despesa pública atingiu 51,2% do PIB, o que equivale a mais de 88 mil milhões de euros.
No conjunto de 2011 e 2012, a despesa pública cairá mais de 10 mil milhões de euros, o que equivale a uma redução de mais de 12% em termos nominais. (...) Esta redução foi conseguida mesmo num contexto de forte aumento dos juros pagos. Esta realidade tornou o ajustamento mais difícil. (...)
Proponho-vos, em alternativa, a análise da evolução da despesa corrente primária, que exclui o pagamento de juros e as despesas de capital. A quebra é aí de quase 8 mil milhões de euros, ou seja, uma redução de mais de 10% em termos nominais.
A redução da despesa pública é inquestionável, não tem qualquer paralelo na história recente de Portugal. Repito, a redução da despesa pública é inquestionável.
(...)
A despesa corrente ficará 700 milhões abaixo do orçamentado.

Apesar de todos estes progressos, o ajustamento orçamental tem ocorrido a um ritmo inferior ao esperado. De facto, a reestruturação da economia portuguesa em direcção a sectores produtores de bens transaccionáveis tem-se manifestado numa composição do produto menos favorável à execução da receita fiscal e contributiva. Estes desenvolvimentos, associados a quebra no consumo de bens sujeitos a maior tributação, tem tido impacto nos impostos indirectos. Quanto aos impostos directos, os menores lucros das empresas no contexto da recessão têm-se feito sentir na evolução do IRC. Também a quebra da massa salarial se tem manifestado em receitas menores do que o esperado no IRS e nas contribuições para a segurança social.
O desvio total da receita fiscal e contributiva face ao orçamento de 2012 será na ordem dos 3300 milhões de euros (...). Para respeitar o limite de 5% do PIB para o défice orçamental, serão fundamentais as medidas de consolidação orçamental que iremos adoptar até ao final do ano.
Do lado da despesa, destaca-se a suspensão de projectos de investimento e medidas de contenção de despesa na segurança social.
Do lado da receita, serão antecipadas algumas medidas fiscais previstas para 2013. É o caso do agravamento da tributação sobre os rendimentos de capitais e mais valias e sobre imóveis de valor igual ou superior a 1 milhão de euros. Adicionalmente, as transferências de/e para paraísos fiscais, não declaradas nos termos da lei, serão sujeitas a tributação agravada em sede de IRS.
Estas medidas complementadas por um esforço acrescido de contenção e controle orçamental permitirão poupanças de cerca de 0,3% do PIB, ou 500 milhões de euros.
(...)

No entanto, para além destas medidas foi necessário encontrar um conjunto de medidas substitutivas dos artigos 21º e 25º da lei do OE 2012 consideradas inaplicáveis, para além desse ano, pelo Tribunal Constitucional.
A opção do governo corresponde a uma abordagem abrangente que terá em conta as implicações do princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos. A solução inicialmente proposta pelo governo, e que envolvia um elemento de desvalorização fiscal, não mereceu o consenso alargado necessário para a sua eficácia. Sendo assim, foram recolhidos diversos contributos dos parceiros sociais que se encontram reflectidos em medidas concretas. A continuação do diálogo construtivo em sede de concertação social é um elemento chave para o sucesso do ajustamento.

Passo agora a explicar a solução proposta pelo governo.
Será devolvido 1 subsídio aos funcionários públicos e 1,1 subsídios aos pensionistas e reformados. As linhas gerais estão estabilizadas, os detalhes poderão ser modificados antes da proposta de lei do OE 2013 ou durante a discussão do próprio orçamento de Estado para 2013.
O aumento de despesa para o Estado que resulta destas reposições será compensado com medidas de carácter fiscal. Estas medidas visam uma distribuição mais equitativa do esforço de consolidação orçamental entre o sector público e o sector privado, por um lado, e entre rendimentos do trabalho e rendimentos do capital, por outro.
A repartição do esforço entre o sector público e o sector privado será alcançada por via dos impostos directos, com particular incidência para o IRS. Assim, o número de escalões do IRS será reduzido dos actuais 8 par 5 (...). No novo regime, com o objectivo de salvaguardar as famílias de menores rendimentos, tivemos a preocupação de manter os limites actuais para o mínimo de existência de forma a proteger mais de 2 milhões de famílias. Para o total da economia, com a alteração proposta da estrutura de escalões e de taxas, a taxa média efectiva de IRS passa de 9,8% para 11,8%. Naturalmente, quanto maior o rendimento, maior a taxa média de imposto (...).
Para além do reescalonamento do IRS, será ainda introduzida uma sobretaxa de 4% sobre os rendimentos auferidos no ano de 2013. Esta taxa será aplicada nos moldes idênticos a 2011. Quando se considera o efeito da sobretaxa, a taxa média efectiva do IRS aumenta para 13,2%.
Para os contribuintes com rendimentos mais elevados, e tal como em 2012, será ainda exigido um esforço acrescido, isto é, os contribuintes do último escalão estarão sujeitos a uma taxa adicional de solidariedade de 2,5%."



Sobre o IRS em 2013, para já só se sabe que os actuais oito escalões vão ser reduzidos a cinco:





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