quinta-feira, 5 de junho de 2014

Passos Coelho ataca o Tribunal Constitucional


Depois de terem sido chumbadas pelo Tribunal Constitucional (TC) três normas do Orçamento do Estado deste ano, Passos Coelho defendeu uma melhor escolha e um maior escrutínio dos juízes deste tribunal:



05/06/2014 - 00:57


"Uma coisa é não concordarmos com determinadas leis, termos divergências políticas grandes quanto à natureza da legislação que é aprovada; outra coisa é dizer que essa legislação é inconstitucional. Claro que, quando as coisas são confundidas, nós tenderemos a dizer que, com o uso que é feito, as prerrogativas dos juízes e do tribunal são desvirtuadas. Mas isso não se resolve acabando com o tribunal, evidentemente. Resolve-se escolhendo melhor os juízes. E creio que todos temos responsabilidades nessa matéria.

Quem, recorrendo a princípios tão gerais e difíceis de definir e de densificar, determina a inconstitucionalidade de determinados diplomas em circunstâncias tão especiais da vida do País, quem está nesta posição, deveria ter um escrutínio muito maior do que aquele que foi feito até hoje.

Nós não temos sido, se calhar, tão exigentes quanto deveríamos. Mas creio que a nossa discussão deve estar mais orientada para saber como é que uma sociedade com transparência e maturidade democrática pode conferir tamanhos poderes a alguém que não foi escrutinado democraticamente, em vez de estar a defender alterações radicais no próprio sistema.”

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Recordamos que a Constituição da República determina no seu artigo 222.º:
1. O Tribunal Constitucional é composto por treze juízes, sendo dez designados pela Assembleia da República e três cooptados por estes.
2. Seis de entre os juízes designados pela Assembleia da República ou cooptados são obrigatoriamente escolhidos de entre juízes dos restantes tribunais e os demais de entre juristas.

Portanto 10 juízes são eleitos pela Assembleia da República, ou seja, são escolhidos pelo poder político, e 3 são cooptados entre os primeiros. Eis um breve currículo dos juízes-conselheiros do Tribunal Constitucional (TC):

O presidente do TC, Joaquim Sousa Ribeiro, nasceu no Porto, em 1946, e é formado em Direito e professor universitário. Foi eleito para o TC pela Assembleia da República (AR) a 5 de Julho de 2007, sob proposta de PS e PSD, desempenhando o cargo de presidente desde 2 de Outubro de 2012.

A vice-presidente, Maria Lúcia Amaral, nasceu em Angola, em 1957, e é formada em Direito e professora universitária. Foi eleita pela AR, sob proposta do PSD, a 29 de Março de 2007.

Ana Guerra Martins nasceu em Lisboa, em 1963, e é formada em Direito e professora universitária. Eleita pela AR, sob proposta do PS, iniciou funções a 4 de Abril de 2007.

Carlos Fernandes Cadilha nasceu em Viana do Castelo, em 1947, e é formado em Direito. Era juiz conselheiro no Supremo Tribunal de Justiça desde 2003. Eleito pela AR, sob proposta do PS, iniciou funções a 4 de Abril de 2007.

João Cura Mariano Esteves nasceu em Coimbra, em 1957, e é formado em Direito e professor universitário. Desempenhou funções de juiz em diversos tribunais. Eleito pela AR, sob proposta do PSD, iniciou funções em 4 de Abril de 2007.

Catarina Sarmento e Castro nasceu em Coimbra, em 1970, e é formada em Direito e professora universitária. Foi Adjunta do Ministro da Administração Interna (1995-97). Eleita pela AR, sob proposta de PS e PSD, iniciou funções a 4 de Fevereiro de 2010.

José da Cunha Barbosa nasceu em Vila Nova de Gaia, em 1950, e é formado em Direito, tendo desempenhado cargos no Ministério Público e no Supremo Tribunal de Justiça. Eleito pela AR, sob proposta do PSD, iniciou funções a 12 de Abril de 2011.

Fernando Vaz Ventura nasceu no Barreiro, em 1961, e é formado em Direito. Desempenhou funções de juiz em diversos tribunais, nomeadamente o Tribunal da Relação de Lisboa. Eleito pela AR, sob proposta do PS, iniciou funções a 12 de Julho de 2012.

Maria de Fátima Mata-Mouros nasceu em Lisboa, em 1960, e é formada em Direito. Juíza de direito com 25 anos de carreira judicial, estava colocada no Tribunal da Relação de Évora. Eleita pela AR, sob proposta do CDS-PP, iniciou funções a 12 de Julho de 2012.

Maria José Rangel de Mesquita nasceu em Lisboa, em 1965, e é formada em Direito e professora universitária. Eleita pela AR, sob proposta do PSD, iniciou funções a 12 de Julho de 2012.

Pedro Pena Chancerelle de Machete, filho de Rui Machete, nasceu em 1965, e é formado em Direito pela Universidade Católica de Lisboa e professor universitário. Iniciou funções no TC a 1 de Outubro de 2012, cooptado pelos restantes membros.

Lino Rodrigues Ribeiro nasceu em Baião, em 1967, é formado em Direito e era juiz conselheiro do Supremo Tribunal Administrativo. Iniciou funções no TC a 20 de Junho de 2013, cooptado pelos restantes membros.

João Barrosa Caupers nasceu em Lisboa, em 1951, e é formado em Direito e professor catedrático. Foi assessor do Provedor de Justiça (1975/1983). Actualmente, é membro do Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários. Iniciou funções no TC a 6 de Março de 2014, cooptado pelos restantes membros.


Analisando a nota do TC sobre o pedido de fiscalização constitucional de quatro normas do OE 2014, ressalta que um dos juízes propostos exclusivamente pelo PSD votou favoravelmente a declaração de inconstitucionalidade de todas as normas submetidas ao julgamento daquele tribunal. Catarina Sarmento e Castro adoptou a mesma atitude, porém, foi também proposta pelo PS para o TC.




Tal declaração sistemática de inconstitucionalidade de todas as normas nem sequer sucedeu entre os juízes apresentados exclusivamente pelo PS ou que perfilham a ideologia socialista. Não é, portanto, de surpreender a manifestação de desagrado de Passos Coelho pela escolha feita pelos sociais-democratas para o TC.

Além de que basear a argumentação de inconstitucionalidade de três normas concretas em princípios gerais de igualdade e de proporcionalidade, que tanto permitem defender qualquer norma como a sua complementar, não é uma decisão jurídica mas de âmbito político.


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