segunda-feira, 23 de junho de 2014

A revolução da educação em Portugal, já


Os alunos de 15 anos de Xangai ultrapassaram os estudantes de todos os 65 países participantes — os 34 países membros da OCDE e 31 países parceiros — em Matemática, Ciência e Leitura, de acordo com o Programa Internacional de Avaliação do Aluno (PISA) em 2009 e 2012, superando-se a si próprios entre as duas avaliações.
É certo que a China não participou como país, apenas os territórios de Xangai, Hong-Kong e Macau. Mesmo assim, qualquer um desses territórios ficou muito à frente de Portugal. Mas não chega, diz o autor do artigo — repleto de informação relevante — que a seguir transcrevemos com a devida vénia.

Tempo dos pais que andam a educar os filhos para príncipes, mas sem a concomitante preparação e sentido de responsabilidade, dos professores que andam a inventar sucesso nas reuniões de avaliação, mas fogem da prova de avaliação de conhecimentos e capacidades, e da sociedade portuguesa que anda a exigir mais bem-estar, mas recusa mudar do sistema da cunha para o princípio do mérito, lerem atentamente este artigo, reflectirem sobre o conteúdo e acordarem para a realidade mundial:


"A revolução da educação na China (english here)

23 Junho 2014, 21:30 por Lee Jong-Wha


Em termos de qualidade e de sustentabilidade do modelo de crescimento, a China tem um longo caminho pela frente.

Nos últimos 35 anos, o forte e sustentado crescimento da produção — média superior a 9,5% em termos anuais — conduziu a uma transformação milagrosa de uma economia rural e planificada para uma superpotência económica mundial. De facto, segundo os cálculos mais recentes do Banco Mundial relativos ao poder de compra dos rendimentos agregados, a China está próxima de ultrapassar os Estados Unidos da América (EUA) como a maior economia mundial. Mas, em termos de qualidade e de sustentabilidade do modelo de crescimento, a China tem um longo caminho pela frente.

Apesar do seu notável crescimento, os 10.057 dólares (ajustados ao poder de compra) de rendimento per capita da China, em 2011, estão na posição 99 em termos mundiais — cerca de um quinto do rendimento per capita dos Estados Unidos, que é de 49.782 dólares. E alcançar o estatuto de país com elevados rendimentos não é um feito fácil. De facto, muitos países tentaram e falharam, deixando-os na chamada armadilha dos rendimentos médios, na qual os níveis de rendimentos per capita estagnaram antes de cruzarem o limiar dos elevados rendimentos.

Um capital humano forte é essencial para permitir à China escapar a este destino. Mas a actual força de trabalho chinesa não tem as capacidades necessárias para apoiar as indústrias de alta tecnologia e de elevado valor. Alterar isto vai exigir uma reforma educativa ampla que aumente e melhore as oportunidades para as crianças, enquanto fortalecem as competências para os adultos.

De facto, durante as últimas quatro décadas, a qualidade da força de trabalho na China melhorou substancialmente, o que é reflectido em ganhos impressionantes no sucesso escolar. As taxas brutas de matrículas ao nível primário ultrapassaram os 100% desde a década de 1990, enquanto as taxas de matrículas ao nível do secundário e do ensino superior atingiram os 87% e os 24%, respectivamente, em 2012. Em 2010, mais de 70% dos cidadãos chineses com idades entre os 15 e os 64 anos receberam educação ao nível do secundário, o que compara com os cerca de 20% em 1970.

Além disso, os estudantes chineses apresentam bons desempenhos em testes internacionais comparáveis. Jovens de 15 anos em Xangai ultrapassaram estudantes de 65 países, incluindo 34 países da OCDE, em matemática, ciência e leitura, de acordo com o Programa Internacional de Avaliação de Aluno (PISA) em 2009 e 2012.

A China beneficiou também do rápido crescimento do emprego, com mais de sete milhões de trabalhadores a entrarem para o mercado de trabalho, todos os anos, desde 1990. Isto, em conjunto com uma grande reafectação dos trabalhadores das áreas rurais para as áreas urbanas, acabou por apoiar as indústrias transformadoras de trabalho intensivo, o que impulsionou o crescimento económico da China.

Mas a vantagem demográfica da China está a diminuir rapidamente devido às baixas taxas de fertilidade e ao envelhecimento da população. De acordo com a Organização das Nações Unidas, em 2030 a população activa chinesa (dos 15 aos 59 anos de idade) vai diminuir em 67 milhões de pessoas, tendo em conta os níveis de 2010.

Além disso, o ensino superior na China deixa muito a desejar, com os inquéritos aos empregadores a revelarem que os diplomados do ensino secundário e universitário frequentemente têm faltas de conhecimentos técnicos necessários e de competências sociais. Por exemplo, em 2013, mais de um terço das empresas chinesas que responderam ao inquérito afirmaram terem tido dificuldades em recrutar trabalhadores qualificados, com 61% a atribuírem isso à escassez de competências de empregabilidade em geral. Assim, como é que pode a China esperar alcançar a diversidade de exportações e modernização tecnológica que precisa para promover-se na cadeia de valor mundial?

Claramente, a China precisa de reformar as suas instituições de ensino superior, incluindo os programas de formação técnicos e vocacionais. Ao mesmo tempo, tem de aumentar as oportunidades para que qualquer pessoa com talento possa ter acesso a um ensino secundário e superior de qualidade, reduzindo deste modo, e substancialmente, as disparidades na acessibilidade e qualidade no ensino superior pelas regiões e pelos grupos sociais. E aos filhos de migrantes nas áreas urbanas têm de lhes ser garantido acesso total ao sistema educativo. Tais esforços para reduzir as disparidades educacionais ajudariam a abordar o desequilíbrio de rendimentos — uma ameaça significativa para o crescimento económico futuro da China.

Tudo isto vai exigir um aumento do investimento público na educação. Actualmente, o investimento público da China em educação, em percentagem do PIB, está abaixo dos padrões internacionais em todos os níveis, mas especialmente no ensino secundário e superior.

Os desafios educacionais na China também se estendem à qualidade. Um ensino inadequado é o principal motor do crescimento do desemprego na China entre os diplomados do ensino secundário e superior, para não falar na diminuição do seu prémio salarial. Isto pode ser solucionado através de um melhor financiamento, de um recrutamento mais efectivo e uma política de compensações e com administrações escolares mais descentralizadas no que diz respeito à tomada de decisões.

Finalmente, apesar de alguns dados sugerirem que existe um excesso de oferta nos licenciados das universidades na China, as actuais alterações demográficas e sectoriais significam que a China vai deparar-se com um défice de abastecimento de 24 milhões de licenciados altamente qualificados ou de escolas de formação profissional até 2020. Para colmatar esta lacuna, a China tem de melhorar os seus programas de formação profissional e técnicos.

Para assegurar que a força de trabalho cumpre com as exigências das rápidas alterações económicas e tecnológicas, a China tem de construir um sistema educativo de alta qualidade. Sem isso, a China pode não conseguir ser a primeira economia mundial por muito tempo.


Lee Jong-Wha é professor de economia e director do Asiatic Research Institute na Universidade da Coreia, e é também conselheiro para os assuntos económicos internacionais do antigo presidente sul-coreano Lee Myung-bak.


Direitos de autor: Project Syndicate, 2014.
www.project-syndicate.org

Tradução: Ana Laranjeiro"


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