quarta-feira, 25 de junho de 2014

A revolução da educação em Portugal, já - II


O objectivo geral dos relatórios TALIS (Teaching And Learning International Survey) é fornecer indicadores internacionais robustos e análises politicamente relevantes sobre o professorado e o ensino, de forma atempada e económica.


1. TALIS 2013

Publicado hoje pela OCDE, o TALIS 2013 está focado no 3º ciclo de ensino (ISCED nível 2) e tem por base dados recolhidos em 34 países — 24 dos países membros da OCDE e 10 países parceiros.

2. Professores e suas escolas

Em Portugal, o professor do 3º ciclo típico é uma mulher de 45 anos, com 19 anos de experiência em ensinar e com formação em ensino. Aliás 73,2% desses docentes são mulheres, enquanto a média no conjunto dos países analisados é 68,1%.

Segundo o relatório — quadro 2.18 —, a média de alunos em Portugal por escola do 3º ciclo ronda 1152, mais do dobro da média (546) no conjunto de países analisados. Em contrapartida temos apenas 22,6 alunos por turma (a média é 24,1), há 10,5 alunos por professor (muito inferior à média que é 12,4) e numerosos elementos com funções de apoio pedagógico — a razão entre o número de docentes e de pessoal de apoio pedagógico é 7,5 (contra a média de 14,4).

Entre as situações problemáticas apontadas — quadro 2.20 — temos 58% a falar dos atrasos dos alunos, um valor também acima da média que se situa nos 51,8%. Aos atrasos juntam-se o vandalismo e os roubos, enquanto situações que acontecem semanalmente, com a percentagem de 7,4% (a média é 4,4%). O uso e posse de drogas e álcool corresponde a 3,6% (contra 1,2% de média). As lesões físicas provocadas por violência entre os alunos correspondem a 5% (a média é 2,3%) e a intimidação ou agressões verbais a professores ou funcionários é de 5,5% (contra uma média de 3,4%).

3. Liderança escolar

Na maioria dos países, os directores frequentam um curso de administração escolar antes de assumirem o cargo, mas em Portugal 25.2% dos directores nunca o fez (contra a média de 15.2%). E 35.5% nunca teve formação para a liderança (a média é 22.2%).

4. Desenvolver e apoiar os professores

5. Melhorar o ensino pela avaliação e feedback

6. Prática docente e ambiente da aula

Comecemos por observar o número de horas de trabalho dos professores — quadro 6.12. Os professores portugueses do 3º ciclo têm uma componente lectiva que ronda as 20,8 horas por semana (média é 19,3 horas) e dizem que passam mais tempo a preparar e planear aulas, justamente 8,5 horas por semana (a média é 7,1), e 9,6 horas semanais a marcar e corrigir trabalhos, o dobro da média.
Portugal é ainda um dos cinco países em que os docentes que dizem ter mais horas de trabalho são também aqueles que tendem a ter níveis mais baixos de satisfação.

Sobre a gestão do tempo de aula — quadro 6.20 —, estes docentes dizem que 75,8% do tempo é gasto de facto a ensinar (contra a média de 78,7%). Do tempo restante, 8,2% é gasto em tarefas administrativas (média é 8%) e 15,7% a manter a ordem na sala de aula (média é 12,7%).

No quadro 6.21 o relatório também avalia a disciplina na sala de aula: 39,9% dos docentes dizem ter de esperar bastante tempo para os alunos se acalmarem no início da aula (contra 28,8% na média), 40,4% perde muito tempo por causa de estudantes que interrompem a aula (contra a média de 29,5%) e 31,1% considera haver muito ruído perturbador na sala (média de 25,6%).

7. Auto-eficácia docente e satisfação profissional

Neste capítulo há alguns resultados incompatíveis com os obtidos no Programa Internacional de Avaliação de Aluno (PISA) no conjunto dos 65 países participantes — os 34 países membros da OCDE e 31 países parceiros.

Comecemos pelo quadro 7.1 onde os professores do 3º ciclo auto-avaliam o seu desempenho. São 97,5% os docentes que acreditam que ajudam os alunos a pensar criticamente, o máximo entre todos os países analisados (a média é 80,3%), 98,3% crêem que usam uma variedade de estratégias de avaliação, outro máximo (a média é 81,9%), são 99,2% os que pensam que são capazes de fornecer uma explicação alternativa para um exemplo quando os alunos estão confusos (média é 92%) e 95,9% acreditam que implementam estratégias de ensino alternativas na sala de aula, mais um máximo entre todos os países analisados (média é 77,4%).
Será que os alunos portugueses de 15 anos também evidenciaram desempenhos tão espectaculares em Matemática, Ciência e Leitura, no PISA? Nada disso. Ficaram abaixo da média em 2009 e 2012.

Finalmente passemos à satisfação profissional dos professores do 3º ciclo — quadro 7.2.
A esmagadora maioria dos professores considera que a profissão é desvalorizada pela sociedade portuguesa: só 10,5% dos inquiridos portugueses é que acha que a sociedade valoriza quem ensina, quando a média nos 34 países analisados se situa nos 30,9%.
Há mesmo 44,5% que se interroga se teria sido melhor escolher outra profissão, (contra uma média de 31,6%).
Questionados sobre se pudessem voltar a decidir, escolheriam ser professores, 71,6% respondeu afirmativamente (mas a média é 77,6%), havendo 16,2% que se arrepende de ter feito esta opção (a média é 9,5%).

No entanto, 70,5% dos docentes portugueses considera que as vantagens de ser professor claramente ultrapassam as desvantagens (a média é 77,4%).
E estão mais satisfeitos com a profissão que têm do que a maioria dos colegas estrangeiros: 94,1% dos docentes portugueses daquele nível de ensino dizem que estão satisfeitos com a profissão (média é 91,2%).





Para este relatório, foi seleccionada, em cada país, uma amostra representativa com um mínimo de 200 escolas com respostas de um mínimo de 20 professores. Assim, a amostra internacional tinha um mínimo de 4000 professores para cada nível ISCED em que esse país participou. A maior parte dos países participou apenas no ISCED 2, o nível que corresponde ao 3º ciclo em Portugal.

*

Pais e professores portugueses têm de olhar para estes resultados e debatê-los. Não adianta procurar tapar o Sol com uma peneira.

Os pais que andam a educar os filhos para príncipes, mas sem a concomitante preparação e sentido de responsabilidade; os professores que andam a inventar sucesso nas reuniões de avaliação, mas fogem da prova de avaliação de conhecimentos e capacidades; os políticos que andam a clamar por investimento na economia, mas só defendem os seus interesses pessoais ou partidários, e a sociedade que anda a exigir mais bem-estar, mas recusa mudar do sistema da cunha para o princípio do mérito e substituir o insulto pelo trabalho, todos têm de acordar para a realidade dos números. Não há inocentes.

Um começo será ler estes comentários à notícia no Público e reflectir sobre o conteúdo:


Sergio Simões Lopes
25/06/2014 10:14
Nada é fortuito, nada é casual. No Universo tudo é acção e reacção. O primeiro passo é a reflexão e a identificação de posturas e responsabilidades.
Professor que rejeita a avaliação externa, rejeita o mérito. Professor que defende a auto-avaliação como elemento único de prova de competência e actualização dos conhecimentos, desvaloriza parte do seu próprio papel como educador e avaliador.
Professor que só enche ruas em protestos na defesa dos seus interesses pessoais e cala-se ao curso de um ataque ao sistema público de ensino, desvaloriza-se como profissional da educação e como cidadão.
Professor que revela desleixo na aparência e desrespeito por horários e compromissos, iguala-se à parcela da sociedade que é vista com desconfiança. Reformulem-se e recuperarão prestígio perdido.

Vidal Prudencio
25/06/2014 14:02
O professorado é uma profissão digna e sempre muito considerada pelos portugueses. Infelizmente um dos Sindicatos, comandado por um agente verrinoso, tem agido de uma maneira radicalizada e partidária o que leva a que grande parte da população condene alguns procedimentos e daí a imagem menos boa que passa para os professores...

coelho.ja
25/06/2014 15:08
Obviamente que uma classe que se deixou instrumentalizar pelos agentes do PCP (Mário Nogueira e afins), não pode esperar reconhecimento da sociedade... Quem quer ser respeitado tem que se dar ao respeito e isso foi tudo o que os professores não fizeram...
O expoente máximo dessas atitudes irresponsáveis foi a 'guerra' contra a avaliação (qualquer avaliação), nos tempos da Maria de Lurdes Rodrigues. Perderam uma oportunidade histórica de se afirmarem pela positiva — e poderem serem vistos pela sociedade como alguém que privilegia a melhoria da qualidade do ensino, em detrimento do basismo da FRENPROF. Infelizmente, como sucede (quase) sempre em Portugal, o corporativismo atávico dos comunistas (e afins) prevaleceu...

Ana Cristina Fontes
25/06/2014 17:27
Sou professora desde 1986. Os dados apresentados, na minha opinião, correspondem à realidade.
Queria apenas destacar a percentagem de tempo que é gasta, em média, para manter, ou tentar manter, a disciplina na sala de aula. Creio que este é um dos principais problemas do ensino atual, um problema que se tem vindo a agravar ao longo dos últimos anos com evidente prejuízo para os alunos. Enquanto o problema da disciplina não for encarado seriamente e os alunos penalizados pelos comportamentos que manifestam, os resultados escolares dos nossos estudantes não melhorarão.
A sala de aula deve ser encarada como um local de trabalho onde é necessário ler, escrever e interpretar. Enfim, trabalhar! É preciso reconhecer o mérito! É preciso que os encarregados de educação sejam, eles mesmos, disciplinadores.


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