O País precisa de um acordo de médio prazo entre os três partidos que subscreveram o Programa de Assistência Financeira — PSD, PS e CDS — com a troika para estabelecer uma estratégia de responsabilidade orçamental de médio e de longo prazo e implementar reformas estruturais que transcendam uma legislatura, criando as bases para um novo modelo de desenvolvimento.
Mas se algum partido político for para a negociação desse acordo com a intenção de pôr o interesse partidário acima do interesse nacional, obviamente que essa negociação só pode fracassar.
Foi o que sucedeu, para mal dos portugueses. Hoje o País parou para ouvir a comunicação do Presidente da República.
Cavaco Silva entende que a melhor solução de governabilidade, após o fracasso das negociações do Compromisso de Salvação Nacional, é a continuação em funções do actual Governo, sustentado pela maioria PSD-CDS, que vai propor uma moção de confiança ao parlamento.
E deixou dois avisos a Paulo Portas com cinco parágrafos de intervalo: "É essencial que os dois partidos que integram a coligação estejam sintonizados (...) o Presidente da República nunca abdicará de nenhum dos poderes que a Constituição lhe atribui."
Aqui fica a comunicação:
"Portugueses,
No passado dia 10, expus ao País uma forma de ultrapassar a actual crise política. Apresentei a solução que considero a melhor para a resolução dos problemas nacionais, numa perspectiva imediata, mas também num horizonte temporal de médio prazo.
Essa solução implicava a realização de um Compromisso de Salvação Nacional entre os três partidos que, em 2011, subscreveram o Memorando de Entendimento com as instituições internacionais.
Um acordo entre essas três forças partidárias, que representam 90% dos Deputados à Assembleia da República, reforçaria a nossa capacidade negocial com as instituições internacionais, atenuando os pesados sacrifícios exigidos aos Portugueses.
Além de promover a estabilidade política, um compromisso de médio prazo iria melhorar as condições de crescimento da economia e de criação de emprego.
A uma maioria parlamentar juntar-se-ia o apoio do maior partido da oposição às medidas que, após negociação conjunta com as instituições internacionais, se revelassem indispensáveis para completar com êxito o Programa de Assistência Económica e Financeira e, bem assim, para conseguir o regresso do País aos mercados em condições mais favoráveis e para assegurar o normal financiamento do Estado e da economia.
Concluído o Programa de Assistência, em Junho de 2014, iniciar-se-ia então o processo com vista à abertura de um novo ciclo político, através da realização de eleições, sendo garantidas ao Executivo condições mais consistentes de estabilidade e de governabilidade.
Seria ainda assegurado ao novo Governo o apoio parlamentar, por parte dos partidos signatários do Compromisso, às medidas indispensáveis para defender os interesses nacionais numa fase crucial da nossa vida colectiva, o período pós-troika.
Aos agentes económicos e aos parceiros sociais, aos investidores nacionais e estrangeiros, às instituições internacionais e aos nossos parceiros da União Europeia, daríamos a perspectiva, num horizonte temporal alargado, de que somos um País dotado de estabilidade política, que segue uma estratégia coerente de desenvolvimento sustentável.
Afastaríamos a ideia de que somos um País em que, quando muda o Governo, mudam as orientações fundamentais em matéria de política económica, como a sustentabilidade da dívida pública e o controlo do endividamento externo. No fundo, afastaríamos a ideia de que somos um País imprevisível.
Desde o início do século XXI, temos caminhado aos avanços e recuos: a um período de grandes ilusões segue-se sempre um período de forte austeridade. Ao fim de mais de uma década, ainda não encontrámos forma de nos libertar deste ciclo vicioso.
As circunstâncias actuais eram particularmente propícias para que se fizesse um esforço sério para instaurar em Portugal uma cultura política de diálogo e de compromisso semelhante à que existe na generalidade das democracias europeias.
Recordo que, na União Europeia, 75% dos países de média dimensão, como Portugal, são governados com base em entendimentos políticos entre um leque partidário alargado.
A nossa situação económica e financeira é grave. É elevado o risco de os Portugueses serem obrigados a novos e mais pesados sacrifícios – e todos os partidos estão bem conscientes disso.
Nestas ocasiões de emergência, é um dever fundamental lutar pela melhor solução, pela solução que traga uma esperança mais forte aos Portugueses, apelando ao sentido de responsabilidade dos agentes políticos e a que coloquem o superior interesse nacional acima dos interesses partidários.
A solução que propus é indubitavelmente a que melhor serve o interesse nacional, e tenho fundadas razões para crer que os partidos que subscreveram o Memorando de Entendimento partilham esta opinião. Tanto assim é que o Partido Social Democrata, o Partido Socialista e o CDS-Partido Popular encetaram negociações para alcançar um Compromisso de Salvação Nacional.
Desde a primeira hora, dei o meu apoio inequívoco à realização desse Compromisso. Lamento que, após seis dias de trabalho conjunto, os três partidos não tenham conseguido alcançar o entendimento desejado.
Não quero recriminar nenhum partido.
Saliento a importância histórica desta nova atitude de abertura ao diálogo e o reconhecimento público da necessidade de alcançar entendimentos alargados em torno de matérias determinantes do nosso futuro colectivo.
Congratulo-me pelo facto de os dirigentes dos partidos da maioria e os dirigentes do maior partido da oposição terem dado provas, perante os Portugueses, de que é importante dialogar e alcançar consensos, tal como foi sublinhado pelos agentes económicos e pelos parceiros sociais.
Não se alcançou a solução ideal, mas todos reconheceram a importância de uma cultura política de compromisso.
Estou certo de que foram lançadas sementes, e que essas sementes irão frutificar no futuro. Mais cedo ou mais tarde, um compromisso interpartidário alargado será imposto pela evolução da realidade política, económica e social do País, tal como se verifica na generalidade dos países europeus de média dimensão.
Estou igualmente convicto de que os cidadãos se encontram agora mais conscientes da necessidade de um consenso entre os partidos que subscreveram o Memorando de Entendimento, sendo esta a solução que melhor serve o interesse nacional e que mais contribui para a melhoria das condições de vida dos Portugueses.
Portugueses,
Em democracia, existem sempre soluções para as crises políticas.
Na minha Comunicação ao País, apresentei, com toda a clareza, as razões pelas quais considero que, no actual contexto de emergência nacional, a convocação de eleições antecipadas não constitui uma solução para os problemas que Portugal enfrenta.
Assim, não tendo sido possível alcançar um Compromisso de Salvação Nacional, considero que a melhor solução alternativa é a continuação em funções do actual Governo, com garantias reforçadas de coesão e solidez da coligação partidária até ao final da legislatura.
Dispondo o Executivo do apoio de uma maioria parlamentar inequívoca, como recentemente se verificou, deve ficar claro, aos olhos dos Portugueses e dos nossos parceiros europeus, que Portugal é um país governável.
O Governo, que sempre se manteve em plenitude de funções, deve fazer um esforço acrescido para preservar as vias de diálogo que agora se abriram. É essencial salvaguardar o espírito de abertura ao compromisso manifestado ao longo de uma semana de negociações interpartidárias.
Deve ser aprofundado o diálogo com os parceiros sociais e com os agentes económicos, que demonstraram, ao longo de todo este processo, um admirável sentido de responsabilidade. O seu contributo deve ser valorizado e as suas propostas examinadas com a melhor atenção.
É essencial que os dois partidos que integram a coligação estejam sintonizados, de forma duradoura e inequívoca, para concluir, com êxito, o Programa de Assistência Financeira e o País regressar aos mercados, por forma a assegurar o normal financiamento do Estado e da economia.
Isto implica, desde logo, a aprovação e entrada em vigor do Orçamento do Estado em Janeiro de 2014.
Afigura-se igualmente fundamental que todo o Governo assuma como prioridade o reforço da aplicação de medidas de relançamento da economia e de combate ao desemprego.
Num quadro de exigência e rigor, o Governo deverá aprofundar as medidas de estímulo ao investimento e de captação do investimento externo, onde se incluem a estabilidade e a previsibilidade do sistema fiscal.
Por outro lado, os parceiros da coligação governamental têm de se empenhar, concertadamente, na criação de condições para realizar, com firmeza e credibilidade, as negociações com as instituições internacionais que a situação portuguesa exige.
Os partidos da coligação apresentaram ao Presidente da República garantias adicionais de um entendimento sólido para alcançar estes objectivos e a informação de que o Governo irá solicitar à Assembleia da República a aprovação de uma moção de confiança e aí explicitará as principais linhas de política económica e social até ao final da legislatura.
Por último, quero afirmar aos Portugueses que, se o actual Governo se mantém em plenitude de funções, o Presidente da República nunca abdicará de nenhum dos poderes que a Constituição lhe atribui.
A garantia de governabilidade e o exercício das competências constitucionais de cada órgão de soberania representam o melhor sinal de confiança que devemos transmitir aos Portugueses.
Boa noite."
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