quarta-feira, 30 de julho de 2014

Tem dúvidas sobre o BES? Aqui estão algumas respostas


O Banco Espírito Santo procede hoje à apresentação das contas relativas ao primeiro semestre e há o receio de que possam revelar um prejuízo próximo de 3 mil milhões de euros. Receio que é aumentado pela desconvocação da assembleia-geral extraordinária.
Tentando serenar os ânimos, o Negócios responde a algumas questões sobre o banco agora liderado por Vítor Bento que a seguir transcrevemos:

"Os resultados negativos esperados no BES no primeiro semestre são motivo de alarme?
É certo que os números do BES relativos aos primeiros seis meses do ano não serão positivos. A questão é quão negativos serão. E essa questão tem levantado fortes dúvidas nos analistas e nos investidores. O jornal Expresso avançou que o prejuízo poderá ascender a cerca de 3 mil milhões de euros. O que poderá não ser totalmente coberto pela almofada de capital que o banco tem. A almofada é o capital que o banco tem e que, mesmo que o venha a perder, permite manter-se acima dos rácios mínimos exigidos pelos reguladores.

No início desta semana, e depois das notícias que dão conta de um resultado líquido negativo de tal dimensão, o Banco de Portugal quis voltar a esclarecer os clientes de que "caso venha efectivamente a verificar-se qualquer insuficiência da actual almofada de capital", tal não é motivo para alarme.

E porquê? O Banco de Portugal tem repetido várias vezes que já diversas entidades assumiram interesse em adquirir uma posição de referência no capital do BES. O que "indicia que é realizável uma solução privada para reforçar o capital". Ainda assim, relembra o regulador liderado por Carlos Costa, há sempre em cima da mesa a possibilidade de se recorrer a dinheiro público, neste caso, os 6,4 mil milhões de euros que restaram dos 12 mil milhões dedicados à banca no memorando de entendimento assinado entre o Governo português e a troika (Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu). Algo que tanto o Governo como o Banco de Portugal referem que é o cenário de último recurso.

Os contribuintes podem ser chamados a apoiar o banco?
Recusar o apoio do Estado foi uma das obsessões de Ricardo Salgado e da família Espírito Santo desde a chegada da troika. Os 1.045 milhões de euros que o BES conseguiu levantar, há um mês num aumento de capital privado, funcionam como uma reserva adicional de solidez que pode ser útil caso o banco venha a sofrer com a exposição ao GES — cuja dimensão ainda não se conhece totalmente e que só nos resultados do primeiro semestre estará inscrita. Face ao alastrar da crise na área não financeira do GES, não se pode assegurar que os contribuintes não venham a ser chamados a ajudar o BES, através da injecção de fundos públicos no banco. Esse apoio será dado apenas ao banco, nunca à área não financeira, como tem sublinhado o primeiro-ministro.

A desconvocação da assembleia-geral afecta a nova equipa de gestão?
O Espírito Santo Financial Group pediu para ficar sob o regime de "gestion contrôlée" (gestão controlada) no Luxemburgo, onde está sedeado, o que foi aceite pelo tribunal do comércio do grão-ducado. Algo que levou o ESFG a pedir para serem retiradas as propostas que tinha lançado à assembleia-geral marcada para 31 de Julho (depois secundadas por propostas do antigo parceiro Crédit Agricole), nomeadamente a ratificação do nome de Vítor Bento como presidente da comissão executiva. Esta nomeação não fica em causa.

Vítor Bento é o novo CEO e irá continuar a exercer esse cargo. O mesmo acontece com João Moreira Rato e José Honório, que o acompanham na gestão. É esta equipa que terá de lidar com a actual delicada situação do BES. Foram cooptados pela administração e os seus nomes têm de ser ratificados pelos accionistas. Mas a assembleia não precisa de realizar-se já. Pode esperar.

O mesmo não acontece com Paulo Mota Pinto. O social-democrata, que havia sido proposto para presidente do conselho de administração, não entra já na estrutura do banco, dado que a proposta com o seu nome foi retirada pelo ESFG. Ao contrário de Bento, Moreira Rato e Honório, o deputado não pode ser cooptado para aquele cargo porque, neste caso, precisa de ser eleito por uma assembleia-geral de accionistas. Que não irá ocorrer a 31 de Julho, como previsto, mas que também não tem uma nova data marcada. Só depois de uma nova assembleia-geral é que Mota Pinto poderá chegar ao topo da administração do BES.

Os novos desenvolvimentos trazem dúvidas para os depósitos dos clientes do BES?
Não. Os depósitos dos clientes do BES até 100 mil euros por titular estão seguros, uma vez que é este o valor protegido pelo Fundo de Garantia de Depósitos. Acima deste valor também há razões para acreditar que o banco tem uma situação de solidez suficientemente confortável para dar segurança aos seus clientes. Tal como já referido, no limite, se a exposição do BES aos problemas financeiros do Grupo Espírito Santo causar problemas de capitalização ao banco, este poderá recorrer ao apoio do Estado. A linha de apoio público continua acessível e dispõe de 6,4 mil milhões. Tanto o Governo como o Banco de Portugal têm relembrado que este dinheiro existe: mesmo que seja para utilizar apenas em último recurso. O regulador liderado por Carlos Costa voltou a referi-lo esta segunda-feira, 28 de Julho: "a solvência do BES e a segurança dos fundos confiados ao banco estão asseguradas".

Os clientes de retalho do BES que investiram em papel comercial do GES podem estar tranquilos?
Os clientes de retalho que investiram em papel comercial das empresas da área não financeira continuam a salvo, apesar de a Espírito Santo Financial Group, que tem 20,1% do BES, ter entrado num processo de gestão controlada. Isto porque o seu reembolso será garantido pelo próprio banco, devendo o custo associado ser reflectido nos prejuízos do primeiro semestre. O ESFG foi obrigado pelo Banco de Portugal a registar uma provisão especial de 700 milhões. Este dinheiro deveria ser usado para pagar a estes investidores, caso as empresas que emitiram aqueles títulos não tivessem condições para lhes devolver o valor investido. Com o pedido de gestão controlada aceite pelo tribunal do Luxemburgo, a sociedade deixa de poder assumir esse compromisso. Cabe ao banco responsabilizar-se pelo pagamento aos seus clientes de retalho que investiram no papel comercial da área não financeira do grupo, penalizando os seus próprios resultados.

E os trabalhadores?
Para já, apenas os trabalhadores que têm acções do BES estão a ser afectados pela desvalorização dos títulos. Os restantes estão a viver um momento conturbado que, por enquanto, não passa disso mesmo. Se a situação entrar nos cenários limite, por exemplo, com recurso ao apoio do Estado, pode haver necessidade de reduzir o quadro de pessoal ou cortar salários, como aconteceu no BCP, para garantir que o banco tem condições de viabilidade para devolver a ajuda pública.

A concessão de créditos pode ser afectada pela crise no GES?
Neste momento, devido ao maior escrutínio do Banco de Portugal, o banco estará a ser ainda mais cauteloso na concessão de crédito. No entanto, se no limite for necessário o apoio do Estado, haverá maior controlo na actividade central do BES.

Porque é que a queda das acções pode ser um problema?
A desvalorização das acções do BES é um problema, sobretudo, para os accionistas, cujo património diminui. No caso dos grandes investidores, como o ESFG, que tem 20,1%, e o Crédit Agricole (14,6%), o Bradesco (3,9%) e a PT (2,1%), a queda dos títulos pode mesmo obrigar ao registo de imparidades nas contas destas empresas, por forma a reconhecer a desvalorização destas participações. Também os investidores que tenham dado acções do BES como garantia de empréstimos poderão ser chamados a reforçar os colaterais apresentados, já que os títulos passarão a ser insuficientes para fazer face a um mesmo empréstimo."


Sem comentários:

Enviar um comentário