domingo, 20 de março de 2011

A imagem do desperdício




Esta fotografia do Conselho de Ministros é paradigmática do que se passou na função pública, tanto no sector administrativo como no sector empresarial do Estado no que respeita ao choque tecnológico.
Reparem na posição dos ecrãs e teclados dos computadores que estão à frente de cada ministro. Os ministros tem papéis junto de si e no outro lado da mesa está o ecrã, o teclado e o rato.
Observem as mãos de Luís Amado a usar o seu telemóvel e vejam a distância a que se encontram do teclado do computador: mesmo esticando os braços não consegue tocar nas teclas para introduzir ou procurar informação.
Os computadores estão ali como meros objectos decorativos, para simular uma competência informática que os ministros não têm, com excepção de Mariano Gago.

Na Assembleia da República os computadores estão lá para os deputados votarem e lerem o correio electrónico. A maioria nada mais sabe fazer.

O plano tecnológico consistiu em comprar um milhão de computadores e despejá-los na função pública. Só depois se começou a dar aos trabalhadores a formação informática necessária para os poderem usar.
Na educação, que é onde o processo está mais avançado, só neste ano escolar é que está a fazer a certificação informática dos professores, mas os computadores já chegaram há dois anos. Sabendo que os computadores vieram com o Windows Vista e a Microsoft já está a vender, há um ano, o sistema operativo seguinte — Windows 7 — por aqui se pode estimar o desperdício de dinheiro que houve.
Será assim tão difícil de perceber que primeiro se devem equipar as salas de formação e formar os funcionários e depois repartir as compras por fases à medida que cada centena de milhar de trabalhadores adquirisse competência informática?

Em muitos agrupamentos de escolas todas as salas de aula têm um computador sobre a secretária do professor, porém, poucas têm videoprojector. De que serve um computador na sala de aula, se o professor não puder projectar num quadro interactivo, num ecrã de projecção ou numa simples parede o que está no ecrã do computador? Puro esbanjamento.
Uma boa planificação também deve assegurar a formação de técnicos e o fornecimento de peças para reparar o equipamento. Na escola onde trabalho, da trintena de computadores portáteis que chegou à biblioteca em 2007 só um ainda funciona; dos portáteis que foram adquiridos pelos professores no âmbito do programa e-escolas, a 150 euros, poucos estão operacionais porque qualquer reparação excede largamente essa quantia e, aproximando-se do valor real da máquina, é preferível comprar um computador de melhor qualidade.
Porque puseram o carro à frente dos bois? Porque os eleitores dão muita importância à parafernália tecnológica — telemóveis, consolas de jogos, televisores com ecrãs de plasma, ipods, ipads, computadores, ... — e havia eleições em 2009.

No futuro, o país vai recuperar este investimento tecnológico? Pouco, para além dos benefícios da massificação da Internet, porque a política educativa não privilegia as disciplinas das ciências exactas — Física e os seus ramos Electrónica, Física de Materiais, ... — onde se ensine os conhecimentos básicos que permitiram criar tais equipamentos. Os alunos aprendem a usar mas não aprendem os fundamentos, nem aprendem a produzir e, muito menos, a projectar estes dispositivos electrónicos. O governo preferiu apostar nos cursos profissionais em programação informática, mas esqueceu-se que os professores escasseiam e os alunos sonham com cursos práticos e fáceis na área do turismo.
Aliás as escolas estão cheias de teóricos, de leitores de manuais. Não há técnicos, não há engenheiros com experiência de produção industrial, nem sequer de gestão, não há programadores. Por isso se alinha na "criação" de resultados e na produção de toneladas de papelada inútil.

Quanto à factura, essa chegou célere e é pesada: aumento das importações e crescimento colossal da dívida pública que ascende, em Janeiro deste ano, a 152 mil milhões de euros, subida astronómica das taxas de juro da dívida soberana e a dependência do financiamento do Banco Central Europeu, aumento dos impostos e redução salarial.


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