quarta-feira, 6 de julho de 2011

"Um New Deal para a Europa"


Embora no futuro possam ser pertinentes as razões apresentadas pela Moody's para baixar a notação de Portugal, uma queda de quatro níveis propositadamente para dar uma notação de "lixo" e a sua divulgação no momento em que um novo governo inicia funções mostra, claramente, que o objectivo é contrariar o esforço orçamental que o País está a fazer para cumprir a meta de défice orçamental, piorar a crise da Zona Euro e levar à destruição do euro.
Portanto torna-se imperioso reconhecer que existe uma guerra do dólar contra o euro e divulgar propostas para defender a Europa das agências de rating americanas, como esta de Stuart Holland e Yanis Varoufakis, dois economistas um britânico e outro grego:


"Um New Deal para a Europa

A Europa tem vindo a perder uma guerra travada entre governos eleitos e agências de notação não eleitas. Os governos têm tentado governar, mas as agências de notação dominam. Sabem-no os eleitores e alguns estados-membros, cientes disto, opõem-se a transferências financeiras para outros.

Contudo, alguns, nomeadamente a Alemanha, ganharam com um Euro que está menos valorizado e mais competitivo do que estaria se a Zona Euro fosse constituída por menos países. Situações de incumprimento por parte dos países mais expostos à dívida atingiriam bancos e fundos de pensões do centro da Europa da mesma maneira que os da periferia. Ninguém está imune.

Assim, a resposta não é menos, mas mais Europa. Jean-Claude Juncker e Giulio Tremonti argumentaram que a conversão de uma parte das dívidas públicas nacionais em obrigações europeias (Euro bonds) estabilizaria a actual crise. Estamos de acordo.

Uma decisão sobre esta matéria não precisa de ser unânime. Pode resultar de uma cooperação reforçada, como foi o caso da criação do Euro. Os Estados que quisessem manter as suas próprias obrigações, como é provável que seja o caso da Alemanha, podiam continuar a fazê-lo.


Estamos também de acordo com a posição de Juncker e Tremonti sobre a possibilidade de transaccionar globalmente as emissões de Eurobonds, atraindo deste modo excedentes originários de fundos soberanos e de economias emergentes cujos governos tenham apelado para um sistema monetário internacional mais pluralista. Mais do que transferências financeiras no seu interior seriam afluxos financeiros destinados à União Europeia.

Mas também alvitramos que a conversão de uma parte das dívidas nacionais para a União Europeia não tem de ser transaccionada. Podia ser detida pela própria União. Não transaccionada, estaria protegida das agências de notação. As respectivas taxas de juro poderiam ser decididas de modo sustentável pelos ministros das Finanças do Eurogrupo. Estaria immune à especulação. Seriam os governos e não as agências de notação quem governaria.

Também sugerimos que há lições do New Deal dos EUA da década de 1930 que inspiraram a proposta de Jacques Delors de 1993 sobre a necessidade de sustentar uma moeda comum com obrigaçoes europeias comuns.

A administração Roosevelt não precisava que as obrigações norte-americanas fossem financiadas ou garantidas por estados da União, como a Califórnia ou o Delaware, nem lhes solicitava transferências, nem lhes “comprava” dívida. Do mesmo modo, a Europa, não teria de recorrer a tais medidas agora, se emitisse obrigações próprias.

As obrigações norte-americanas são financiadas pela política orçamental comum. A Europa, contudo, não tem uma política orçamental comum. Mas os estados-membros que tivessem convertido parte da sua dívida em Eurobonds poderiam pagar o serviço desta dívida através de receitas fiscais próprias, sem terem de recorrer a transferências financeiras de outros estados.

Não ter ainda recorrido à emissão de obrigações europeias dá à Europa uma vantagem que tem sido descurada. Ou muitas, para a maioria dos estados-membros que estão altamente endividados após o resgate dos bancos. Mas a União propriamente dita não tem praticamente nenhuma. Mesmo com a “compra” de dívidas nacionais a partir de Maio do ano passado, a dívida própria está abaixo de 1% do seu PIB.

Portanto, menos de um décimo do nível a que os EUA recorreram para emitir as obrigações que financiaram o New Deal, cujo êxito gerou a confiança para financiar o Plano Marshall, que recuperou a Europa da Segunda Guerra Mundial e do qual a Alemanha foi um dos maiores beneficiários.

Tampouco a existência de Eurobonds implicaria a criação de uma nova instituição. Obrigações não vulneráveis poderiam ser detidas pelo Fundo Europeu de Estabilização Financeira (European Financial Stability Facility). A emissão de obrigações para favorecer o crescimento tanto poderia ser feita pelo FEEF como pelo BEI. O serviço destas obrigações poderia ser custeado por rendimentos de projectos co-financiados como é o caso das obrigações do BEI.

O BCE é o guardião da estabilidade dos preços, mas o Grupo do BEI pode salvaguardar o crescimento. O BEI já financia projectos num montante duplo do do Banco Mundial. Ao longo de cinquenta anos tem emitido as suas próprias obrigações sem garantias financeiras ou transferências financeiras. Nenhum dos estados-membros mais significativos da Zona Euro contabiliza esses empréstimos como dívida nacional.

A emissão de obrigações não significa “imprimir” dinheiro. Não é financiada por défices. A emissão de obrigações pela União significaria um afluxo de fundos para uma recuperação em vez de austeridade na Europa. É urgente que o Ecofin e o Conselho Europeu o reconheçam, tanto para salvaguardar a Zona Euro como para obter agora coesão económica e social através de um New Deal para a Europa."


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