terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

"Esperança"


"08 Fevereiro 2011, 12:20 por Paulo Pinho

O principal problema económico português não é o défice público, nem o externo.

Nem tão pouco o desemprego, ou mesmo a falta de qualificação da mão-de-obra. Nem sequer a situação de descapitalização e falta de liquidez do sector financeiro e consequente "desalavancagem", eufemismo encontrado para denominar o processo de contracção de crédito e logo do investimento pelo qual a economia está a passar. O nosso verdadeiro problema, espelhado pela ausência de indignação face à situação actual, pela evidente atitude de resignação, pelo espírito pessimista dominante na população e agentes económicos, consiste, afinal, numa profunda ausência de esperança em relação ao futuro.

A economia faz-se de expectativas. Tendo os portugueses perdido a esperança no futuro, actuam em conformidade. Não investindo. Poupando em vez de consumir. Quem tem recursos aplica-os em activos externos. Quem tem mobilidade opta por sair. Hoje, temos uma emigração dual, onde o peso dos qualificados é crescente. Os imigrantes regressam aos países de origem.
O estado geral dos agentes económicos é depressivo. Assim não há economia que cresça, por muito que o marketing propagandístico oficial nos tente vender a imagem de um país virtual que a generalidade dos cidadãos não reconhece.

A agora famosa canção dos Deolinda é, em si mesmo, exemplar: uma geração a quem o poder deixou o encargo de trabalhar uma vida inteira para apagar as dívidas da irresponsabilidade passada protesta em canto. Mas ainda não se revoltou. Esta é a geração dos que estudaram "para ser escravos". Mas como por cá não os escravizam, não lhes dando emprego, tentam emigrar. Se o fizerem, ganham mais na escravidão e escapam a pagar as dívidas da geração anterior. Esta paga o preço da sua irresponsabilidade ficando sem pensão decente. Perante tal perspectiva, não há optimismo que resista. Para nenhuma das gerações.

Perante o pessimismo, a população olha para o poder, como o sempre fez durante séculos. Acreditamos que será sempre do Estado que virá a salvação. Mas não vale a pena ter ilusões. Durante a maior parte desta década, o Estado estará demasiado ocupado a reorganizar-se, a redefinir as suas funções, a reduzir a despesa e a dívida e a diminuir o fardo que a todos impõe via maiores impostos e menores benefícios sociais. Não será, seguramente, através da despesa pública que a economia será relançada, ainda que essa fosse uma forma eficaz de o fazer.

Inverter o pessimismo das expectativas vai depender do aparecimento de uma figura com efectivas capacidades de transmitir optimismo através de uma liderança inspiracional. Sebastianismos à parte, até pode ser que tal figura surja no meio político. Mas duvido de que o Estado, com os problemas urgentes que terá de enfrentar, tenha meios para formular, comunicar, liderar e implementar um verdadeiro processo de reformulação estratégica do País, em geral, e da economia, em particular. Mas não percamos a esperança.

É altura de deixarmos de olhar para o Estado como líder da economia e da sociedade. O modelo está esgotado e conduziu-nos onde agora estamos. A economia, para dar o salto, necessita de se libertar dessa relação simbiótica com o(s) poder(es) político(s) e fazer valer-se por si mesma. O crescimento da economia terá de passar a ser liderado pelo sector empresarial. Necessitamos, enquanto Nação, de ver umas quantas empresas assumir a liderança do processo de modernização e inovação empresariais. E por arrastamento, do País. Precisamos mais de Nokias e Zaras do que de discursos políticos. Infelizmente, uma boa parte — mas não toda — das grandes empresas nacionais habituou-se em demasia a viver à mesa do Estado e do Orçamento. Por isso, também aqui há razões para pessimismo. As excepções, os poucos que até em público ousam criticar o omnipotente Estado, estão entre aqueles que maior sucesso atingiram no exterior. Não sendo estado-dependentes, estão habituados a suceder por mérito próprio, contra a concorrência agressiva dos actores internacionais. É esta a nossa última esperança. Mas se a estas empresas e suas lideranças forem negados os meios para investir e actuar, no contexto do propalado "processo de desalavancagem" resultante da actuação incompetente do Estado, então não haverá qualquer perspectiva de esperança para a economia nacional. Não será uma nova década perdida: serão várias gerações perdidas.

Professor da Universidade Nova de Lisboa"


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