Surgiram, caso inédito, dois requerimentos para a constituição de uma comissão de inquérito ao Banco Português de Negócios (BPN), uma do PS, subscrita pelo PCP e BE, e outra da maioria parlamentar PSD/CDS.
Sabia-se que o consenso para a formação dessa comissão de inquérito, com carácter potestativo, só foi conseguido depois de uma conferência de líderes parlamentares que durou três horas e meia.
E que o líder parlamentar do PS aceitara que o processo de reprivatização do BPN só seria abordado depois do contrato com o angolano banco BIC ser celebrado, quer dizer, depois dos encargos deste péssimo negócio já terem sido atirados para as costas dos contribuintes:
"O ponto referente à reprivatização está incluído e apenas ficou salvaguardado que o contrato final [a celebrar entre Governo e comprador] só será avaliado quando for concluído, o que é absolutamente óbvio. Os deputados não vão interferir na celebração do contrato final, mas acompanharão todo o processo de privatização", disse Zorrinho.
"[A comissão de inquérito ao BPN] terá um objecto que absorve aqueles que eram propostos em cada uma das iniciativas e salvaguarda a questão que para nós era fundamental que era que os trabalhos da comissão não se vão debruçar sobre o processo de reprivatização que está em curso enquanto ele não se concretizar", confirmava o líder parlamentar do PSD, Luís Montenegro.
"Portanto, criaram-se condições para que os trabalhos se pudessem iniciar com esta salvaguarda que era aquilo que nós entendíamos ser o mais importante, mas não quero também deixar de assinalar que é sempre positivo quando no Parlamento se consegue gerar um consenso desta natureza, para que o Parlamento possa cumprir esta sua missão primordial que é fiscalizar os actos do Governo e pugnar por haver transparência em todos os actos da administração e, desse ponto de vista, também é muito positivo".
E o CDS-PP corroborou:
"Quero sublinhar o facto de ter sido possível chegar a um consenso, a um consenso que, no entender do CDS salvaguarda o ponto que para nós é essencial, que todas as responsabilidades de todas as fases do processo do BPN sejam objecto da comissão de inquérito", declarou o líder parlamentar do CDS, Nuno Magalhães, aos jornalistas no final da conferência de líderes.
"Está também salvaguardado, e para nós também era importante, que este processo de averiguação e de inquérito não afectasse uma operação em curso, que tem a ver com o interesse dos contribuintes, em nome do interesse dos contribuintes: que a venda do BPN se processasse da melhor forma possível ou da menos má forma possível do ponto de vista do erário público. (...)
Nesse sentido, creio que é um texto equilibrado, um texto consensual, que tem em atenção todos os interesses em causa, é o texto que no fundo permite, e para o CDS é importante sublinhar isso, o essencial, que é que os contribuintes portugueses, agora que o pesadelo está a acabar, saibam quem, como e porquê causou esta situação de insustentabilidade para o erário público", concluiu o deputado.
Pelo BE, Luís Fazenda também estava satisfeito: "Estão garantidas as condições para a realização de uma investigação aturada sobre toda a verdade do processo BPN. Nesse particular, o Bloco de Esquerda sente-se recompensado, porque antes apresentou uma proposta para uma comissão de inquérito que a maioria chumbou. Mas agora, até por consenso, a maioria acaba por aderir à constituição de uma comissão de inquérito que já tramitou pela mão da presidente da Assembleia da República".
"O PCP congratula-se por ter sido possível chegar-se a um consenso sobre o objecto e a formação da comissão de inquérito, que mantém os direitos potestativos. Abre-se agora uma nova etapa que é a de procurarmos que a comissão de inquérito vá fundo na análise de um negócio à volta do BPN, que já leva muitos milhares de milhões de euros do erário público e que os portugueses precisam de conhecer de quem é a responsabilidade por esse descalabro", rematou Bernardino Soares, líder parlamentar do PCP.
Uma harmonia celestial.
Afinal, soube-se hoje, houve um “conflito brutal” entre o PS, a maioria PSD/CDS e a presidente da Assembleia da República. Tudo porque Assunção Esteves anunciou que estava de acordo com o requerimento apresentado pelos partidos da esquerda, precisamente pelo facto desta iniciativa ter carácter potestativo, logo não dependendo de qualquer votação por ser subscrita por um quinto dos deputados.
Um dos líderes parlamentares da maioria PSD/CDS terá mesmo afirmado que se fosse aprovado o requerimento da esquerda, a maioria parlamentar passaria a chumbar todos os agendamentos da oposição.
Por se sentir desautorizada pela maioria, que ameaçou forçar esta manhã a votação do seu requerimento para a constituição da comissão de inquérito ao BPN, ultrapassando por essa via o requerimento potestativo subscrito pela oposição, parece até que a presidente ameaçou demitir-se. Mas Assunção Esteves garante que não. Diz apenas: "Eu nunca serei pressionável aqui, é um juramento que fiz a mim própria.".
O conflito foi resolvido por meio de um projecto de deliberação, apresentado por Assunção Esteves, para a "constituição de uma comissão parlamentar de inquérito ao processo de nacionalização, gestão e alienação do Banco Português de Negócios", levado a votos em plenário e aprovado por unanimidade.
Ainda bem.
Pena ter sido pressionada a requerer, aos quarenta e dois anos, uma pensão de 7255 euros por dez anos de trabalho como juíza no Tribunal Constitucional.
Pena ter aceite candidatar-se pelo PSD ao cargo de presidente da Assembleia da República, cujo salário é de 5219,15 euros, para depois ter sido pressionada a optar por ser remunerada como pensionista mas continuar a receber os 2133 euros de ajudas de custo do cargo.
Regressemos agora ao ponto de partida, àquela comissão de inquérito arrancada a ferros pelos nossos intrépidos deputados que vai durar 120 dias, no mínimo, e cuja presidência foi atribuída ao PS.
Depois de se mimosearem com umas catilinárias para passar na televisão e deliciar o povinho ao jantar, cada família a puxar pelo seu clube político, qual vai ser o resultado? Este:
"Franco, Porto. 16.03.2012 15:05
Luanda é quem manda
PSD e CDS — os governadores de Portugal, essa quase-província angolana — só aceitam uma comissão de inquérito após a oferta do BPN aos patrões angolanos, de forma a que a dita comissão de inquérito não tenha qualquer resultado prático."
E já está outro caso na forja — o "monstro eléctrico" — repleto de mais contratos redigidos por grandes escritórios de advogados, de que só se vai poder falar quando já nada se puder fazer...
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