terça-feira, 14 de junho de 2011

A zona euro avança para a ruptura


Os artigos de Nouriel Roubini merecem reflexão.

Primeiro, porque o autor doutorou-se em Economia Internacional na Harvard University, trabalhou no FMI, na Reserva Federal e no Banco Mundial, sendo actualmente professor de Economia na Stern School of Business, New York University, e presidente executivo da Roubini Global Economics, uma empresa de consultoria económica.

Em segundo lugar porque, em 2005, Roubini avisou que os preços dos imóveis estavam a atravessar uma onda especulativa que em breve afundaria a economia e foi alcunhado de Cassandra. Em Setembro de 2006, alertou um céptico FMI de que "provavelmente os Estados Unidos enfrentariam uma crise imobiliária gravíssima, um choque petrolífero, um declínio acentuado da confiança dos consumidores e, por fim, uma profunda recessão."
Até Paul Krugman, prémio Nobel da Economia, já admitiu que as suas previsões "aparentemente bizarras" foram verificadas "ou mesmo ultrapassadas pela realidade."

Vejamos, então, o que nos diz Nouriel Roubini no artigo 'The eurozone heads for break up' ontem publicado no Finantial Times:

"13 de Junho de 2011

A abordagem da crise da zona euro, pela via da confusão, não foi capaz de resolver os problemas fundamentais da divergência económica e competitiva na União Europeia. Se isto continuar, o euro vai avançar caoticamente para reestruturações da dívida e, eventualmente, para uma ruptura da própria união monetária, enquanto alguns dos membros mais fracos vão falindo.

A União Económica e Monetária nunca satisfez plenamente as condições de uma óptima zona monetária. Em vez disso, os seus dirigentes esperavam que a ausência de políticas monetárias, orçamentais e cambiais, auspiciaria uma aceleração das reformas estruturais. Estas, esperava-se, auspiciariam a convergência das taxas de produtividade e crescimento.

A realidade acabou por ser diferente. Paradoxalmente, o efeito prestígio da convergência precoce das taxas de juro permitiram uma maior divergência das políticas orçamentais. Uma temerária falta de disciplina em países como a Grécia e Portugal foi apenas acompanhada pelo acumular de bolhas de activos em outros, como a Espanha e Irlanda. As reformas estruturais foram atrasadas, enquanto o crescimento dos salários divergiu em relação ao crescimento da produtividade. O resultado foi uma perda de competitividade na periferia.

Todas as uniões monetárias bem sucedidas encontram-se associadas a uma união política e orçamental. Mas os movimentos europeus para a união política estão paralisados, enquanto os movimentos para a união orçamental exigiriam significativos recursos federais e, também, a emissão generalizada de obrigações em euros — onde os impostos dos contribuintes alemães (e outros nucleares) não apoiam apenas a dívida dos seus países, mas também a dívida dos membros da periferia. É improvável que os contribuintes nucleares o aceitem.

A redução ou o "reescalonamento" da dívida da zona euro vai ajudar a resolver o problema do endividamento excessivo de algumas economias insolventes. Mas nada fará para restaurar a convergência económica, que exige a restauração da convergência da competitividade. Sem isso, a periferia vai simplesmente estagnar.

No ponto onde estamos, as opções são limitadas. O euro pode cair drasticamente, em valor, até — digamos — à paridade com o dólar dos EUA, para restaurar a competitividade da periferia; mas uma queda acentuada do euro é pouco provável dada a força do comércio da Alemanha e as políticas de linha dura do Banco Central Europeu.

O método alemão — reformas para aumentar o crescimento da produtividade e manter uma tampa sobre o crescimento dos salários — também não vai funcionar. No curto prazo, tais reformas tendem, na verdade, a reduzir o crescimento e demorou mais de uma década para a Alemanha restaurar a sua competitividade, um horizonte muito longínquo para as economias periféricas que precisam de crescer rapidamente.

A deflação é uma terceira opção, mas está também associada com recessão persistente. A Argentina tentou este caminho mas, após três anos de recessão cada vez mais profunda, desistiu e decidiu sair do seu padrão monetário. Mesmo que a deflação fosse alcançada, o efeito do balanço aumentaria o peso real das dívidas públicas e privadas. Toda a conversa do BCE e da União Europeia em torno de uma desvalorização interna é, portanto, imperfeita, enquanto a austeridade orçamental necessária ainda tem – no curto prazo – um efeito negativo sobre o crescimento.

Assim, dado que estas três opções são improváveis, há realmente apenas uma outra maneira de restaurar a competitividade e o crescimento na periferia: abandonar o euro, voltar para a moeda nacional e atingir uma desvalorização maciça nominal e real. Afinal, em todas as crises financeiras dos mercados emergentes que restauraram o crescimento foi necessário e inevitável um movimento para taxas de câmbio flexíveis, em cima de liquidez oficial, austeridade e reformas e, em alguns casos, a reestruturação e redução da dívida.

Claro que, actualmente, a ideia de abandonar o euro é considerada inconcebível, até mesmo em Atenas e Lisboa. Sair imporia grandes perdas comerciais no resto da zona euro, através da depreciação real e perdas de capital do núcleo credor, sensivelmente como fez a "pesificação" da dívida em dólares da Argentina, durante a sua última crise.

No entanto, os cenários que hoje são tratados como inconcebíveis podem não ser tão inverosímeis daqui a cinco anos, especialmente se algumas das economias periféricas estagnarem. A zona euro foi colada pela convergência de um crescimento sustentado por baixas taxas de juro, a esperança de que as reformas pudessem manter a convergência, e a perspectiva de uma eventual união política e orçamental. Mas, agora, a convergência sumiu, as reformas estão paralisadas, enquanto a união política e orçamental é um sonho distante.

A reestruturação da dívida vai acontecer. A questão é quando (mais cedo ou mais tarde) e como (ordenada ou caoticamente). Mas mesmo a redução da dívida não será suficiente para restaurar a competitividade e o crescimento. No entanto, se isto não puder ser alcançado, a opção de sair da união monetária tornar-se-á dominante: os benefícios de ficar serão menores do que os benefícios de sair, por mais irregular ou desordenada que a saída possa acabar por ser.
"


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