"25 Janeiro 2011, 11:29 por Paulo Pinho
Num período histórico, não muito distante, em que um Governo colocou o problema do défice no topo da agenda política, se bem que pouco tenha feito para atacar as suas causas profundas, ficou famosa uma frase proferida em plena Assembleia da República pelo Presidente da República de então, segundo a qual existiria "vida para além do défice".
Ninguém poderá discordar de frase tão profunda. Mas valerá a pena recordar que, na altura, o défice excedia o limite de 3% com o qual nos comprometemos no Tratado de Maastricht, enquanto a dívida pública já excedia, embora por pouco, o limite de 60%. Sucede que, hoje em dia, oito anos depois, o valor oficial rondará os 90%. Como terá sido possível?
Será o défice público realmente tão importante ao ponto de se tornar em tema, hoje, tão obsessivo? Em minha modesta opinião, não. Aliás, julgo, que pelo andar do "sentimento dos mercados", em breve se tornará irrelevante, por muito que o Governo português se embrenhe em "adiantar" números que ainda não pode conhecer e se desmultiplique em explicações de cálculos "com e sem submarinos" ou lance cortinas de fumo sobre a óptica da contabilidade pública versus a da contabilidade nacional.
Em condições típicas, o défice mede o aumento do endividamento. Por outras palavras, se o défice medir a diferença entre a despesa e a receita, mede, também, a necessidade de endividamento. Contudo, a criatividade contabilística combinada com práticas de desorçamentação (áreas onde a Grécia se destacou pela negativa), fazem com que a relação entre o valor do défice oficial e o aumento do endividamento sejam cada vez mais difusas. Sendo que o segundo tende a ser cada vez maior do que o primeiro. Por isso, o crescimento da dívida pública total, oficial e das entidades e fundos que não consolidam com o Estado, tem crescido de forma muito significativa sem que os "défices" que o originaram não constem do "défice" para o qual todos olham. Ou olhavam. Honra seja feita ao Tribunal de Contas que muitas vezes tem alertado para a situação. Mas, como os nossos credores (ou "especuladores" no jargão de alguns políticos) andavam distraídos, a coisa passava. E Bruxelas, alinhava.
Costuma dizer-se que se pode enganar alguma gente durante algum tempo; mas que não se pode enganar muita gente durante muito tempo. Ora, quem ler atentamente o que as agências financeiras, de "rating" e imprensa internacional agora dizem sobre a situação actual das nossas finanças públicas verifica que o tom da análise se encontra a desenfocar do número do déficit. A questão da integração do Fundo de Pensões da PT é frequentemente mencionada. Mas, mais importante, é crescente o número dos que comparam o crescimento da dívida em 2010 com o deficit anunciado pelo Governo. E percebem que a bota não bate com a perdigota. Há mais crescimento da dívida do que défice, em 2010, tal como em 2009 e em 2008. E percebem que assim será em 2011. Vêem o défice a diminuir, mas a despesa corrente a subir, sendo óbvio, que o esforço fiscal exigido ao sector privado para compensar este crescimento da despesa trava o crescimento da economia, o que por sua vez compromete a recuperação das receitas públicas. E esse crescimento económico é indispensável para um saudável reequilíbrio das contas públicas. Olham também para as taxas de juro das novas emissões, multiplicam por toda a dívida futura a emitir e percebem que não as conseguiremos pagar.
Neste jogo de expectativas entre o emitente Estado e seus potenciais credores, o primeiro coloca todos os esforços sobre o número oficial do défice. Mas é tarde. Porque os segundos já olham para o crescimento da dívida e correspondente taxa de juro marginal enquanto se interrogam quanto ao crescimento da dívida não-oficial. E percebem que aquele só poderá ser travado por uma travagem da despesa pública e resolução dos défices que se encontram fora do perímetro de consolidação das contas públicas. Por isso, esses são os tópicos enfatizados nas análises que "os mercados" fazem da nossa situação, alguns dos quais recentemente publicados por casas de "research". Hoje, os mercados vêem a dívida que está para além do défice oficial. E sem sinais claros de como o crescimento desta será travado e revertido, o que obriga a um esforço claro de contenção da despesa corrente, Portugal não regressará em condições aceitáveis aos mercados internacionais, condenando-se a si próprio a uma inevitável intervenção externa, porventura mais preocupada com o saneamento financeiro imediato do que com o relançamento da economia a longo-prazo.
Professor da Universidade Nova de Lisboa"
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Pior que o défice orçamental é o défice escondido com o rabo de fora na dívida.
Este artigo não me causa surpresa porque, há algum tempo, verifiquei que os senhores deputados aprovaram a despesa orçamental de 191 milhões de euros para 2010, ou seja, quase o dobro dos 100 milhões estabelecidos no Orçamento de Estado para esse ano. E não é, com certeza, caso único.
Por isso duvidei que a execução orçamental deste ano seja rigorosa e até pedi a vinda do FMI.
A opinião dos outros:
lmgg4690 25 Janeiro 2011 - 17:29
Dívida pública tem de ser "atacada" rapidamente
Como o artigo diz, e muito bem, têm de ser atacados todos os "mini-défices" e "mini-dívidas" que existem nas inúmeras empresas e organizações sob a alçada do Estado e do dinheiro dos contribuintes.
Todos os gestores públicos têm de ter consciência da urgência da situação. Devem conter custos e eliminar todos os gastos não justificáveis.
Enquanto cidadãos, temos de perceber, de uma vez por todas, que ao alimentarmos a economia paralela estamos a diminiuir os nossos próprios salários ou a aumentar os impostos futuros.
E a classe política deve ser responsabilizada. Os políticos devem ter qualidade e ser melhor que a média dos cidadãos.
surpreso 25 Janeiro 2011 - 11:45
Este é o incontornável caminho da falência.
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