domingo, 12 de julho de 2015

Quem não se sente, não é filho de boa gente


Após análise à proposta de reformas do governo grego em troca de um terceiro resgate, um documento elaborado no Ministério das Finanças alemão apontou duas vias: ou condições mais rigorosas a vincularem o governo grego às suas novas promessas ou uma saída temporária do euro.


O ministro das Finanças alemão Wolfgang Schäuble chega à reunião do Eurogrupo de 11 de Julho, em Bruxelas, Bélgica.
Reuters/Francois Lenoir

Após analisarem a proposta de reformas do governo grego, de 9 de Julho, em troca de um empréstimo de três anos, o relatório dos funcionários do Ministério das Finanças alemão conclui que o plano carece de "áreas de reforma importantes e primordiais" e acrescenta: "Precisamos de uma solução melhor e sustentável."

Referido pela primeira vez pelo semanário bávaro Frankfurter Allgemeine Sonntagszeitung e, entretanto, posto a circular nas redes sociais, o documento aponta duas vias: ou condições mais rigorosas a vincularem o governo grego às suas novas promessas ou ter algumas das suas dívidas anuladas e sair do euro durante 5 anos para reestruturar a dívida e fazer reformas estruturais.




O documento cita três coisas que a Grécia poderia fazer para melhorar a sua proposta "rápida e significativamente", com o apoio do parlamento, no sentido de implementarem o terceiro programa com sucesso, garantindo o acesso aos mercados no final:
  • Transferir activos gregos no valor de 50 mil milhões de euros para um fundo externo como a Instituição para o Crescimento no Luxemburgo, para serem privatizados e diminuirem a dívida nacional. Fontes da Zona Euro disseram que Schäuble lançou esta ideia na reunião do Eurogrupo de ontem.
  • Reformar e despolitizar a administração pública, sob a supervisão da Comissão Europeia, para apropriada implementação do programa.
  • Legislar sobre cortes automáticos nos gastos do governo, caso as metas do défice orçamental não sejam alcançadas.
Isto significa que o risco de não concluírem o novo programa do MEE fica com a Grécia, não com os restantes países da Zona Euro.

A alternativa a um plano credível de Atenas, escreveram os autores do documento, era: "Oferecer negociações rápidas à Grécia para uma saída da Zona Euro, com possível reestruturação da dívida, se necessário num formato similar ao Clube de Paris durante, pelo menos, os próximos cinco anos."

O Clube de Paris é um fórum para a reestruturação de dívidas soberanas. O documento nota que isto permitiria aos governos da Zona Euro fazerem writeoffs do valor nominal das dívidas gregas — algo que não é permitido desde que Atenas está também no euro.

Finaliza o documento, dizendo que a Grécia permaneceria na União Europeia e receberia assistência técnica e humanitária, durante o período fora do euro.

Schäuble já havia dito na sexta-feira que a Grécia precisava de um haircut da dívida, mas tais reduções são ilegais dentro da Zona Euro. Nada disse, porém, sobre a solução do enigma.

A ideia de uma saída temporária está em ressonância com as declarações de Hans-Peter Friedrich, vice-líder parlamentar dos conservadores e membro da União Social Cristã (CSU), o partido da Baviera aliado da União Democrática Cristã (CDU) de Angela Merkel.
"O que é necessário é reestruturar e fortalecer a economia grega na sua própria moeda", tinha dito Friedrich ao diário alemão Die Welt.

Os comentários de Friedrich e agora o documento do Ministério das Finanças alemão põem em relevo o dilema da chanceler Angela Merkel.

Fontes do governo de coligação direita/esquerda disseram que o documento foi elaborado após discussões entre Merkel, o vice-chanceler de esquerda Sigmar Gabriel e o ministro das Finanças, Wolfgang Schäuble. Sublinharam que a opção escolhida para a Grécia foi fazer reformas e manter-se no euro.

Mas, para tal, o governo de Tsipras terá de vincular-se mais estreitamente às reformas que propôs na passada quinta-feira e terá sido isso que o ministro das Finanças alemão disse aos seus colegas do Eurogrupo este sábado. Schaeuble não falou de grexit neste Eurogrupo, tendo antes destacado a necessidade de o Governo de Tsipras fazer mais para que possam ser iniciadas as negociações para um terceiro resgate à Grécia.

A chanceler está entalada entre a feroz oposição interna, que a acusa de ser suave com Atenas, e a intensa pressão internacional para conceder a reestruturação da dívida da Grécia num acordo para manter o país no euro, se os gregos entregassem reformas convincentes.

O ministro dos Negócios Estrangeiros luxemburguês, Jean Asselborn, já discordou em entrevista ao jornal alemão Süddeutsche Zeitung, a ser publicada amanhã, segunda-feira:
"Seria fatal para a reputação da Alemanha na UE e no mundo, se Berlim não aproveitar agora a oportunidade que existe com a oferta grega de reformas."
Asselborn já tinha declarado na notícia que antecede essa entrevista: "Se a Alemanha empurra para uma Grexit, vai provocar um conflito profundo com a França. Isso seria uma catástrofe para a Europa."

No entanto, não é a Alemanha que está a adoptar a posição mais dura contra o terceiro resgate à Grécia.

O Governo da Finlândia disse 'não' à proposta grega e pretende que a Grécia saía do euro. O partido Verdadeiros Finlandeses ameaçou desfazer a coligação, se a Finlândia aprovasse um terceiro resgate à Grécia. O parlamento finlandês, que terá de pronunciar-se sobre um novo resgate à Grécia, terá mandatado o Governo para bloquear um acordo com resgate no Eurogrupo.

Mesmo assim, poderá ser alcançado um acordo no Eurogrupo sem o apoio da Finlândia. Os pedidos de resgate ao MEE são decididos por unanimidade entre os ministros das Finanças, mas esta regra pode ser substituída por uma maioria qualificada de 85%, se a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu considerarem que é necessária uma decisão urgente.

A reunião do Eurogrupo terminou ontem à meia-noite sem se obter um acordo, mas prosseguiu na manhã deste domingo.

12 Jul, 2015, 13:40

À saída da reunião de hoje, terminada há pouco, o ministro das Finanças luxemburguês, Pierre Gramegna, declarava: "Todas as opções estão em aberto".

Também o ministro das Finanças belga, Johan Van Overtveldt, opinou que ainda era insuficiente o que se alcançou na reunião dos ministros das Finanças da Zona Euro, apesar de ter-se conseguido acordo em 90% dos assuntos.

Para o ministro das Finanças da Áustria, a decisão final cabe ao parlamento grego que vai votar amanhã, segunda-feira, se aceita o acordo alinhavado no Eurogrupo. Hans Jörg Schelling acrescentou, que apenas "quando todas as condições [acordadas] estiverem cumpridas, será negociado um novo programa de resgate. Nunca antes".

Consta que nesse esboço de acordo estará um terceiro resgate à Grécia de 86 mil milhões de euros. No texto, sugere-se que, em caso de desacordo, deverá ser oferecida à Grécia a saída temporária do euro e, nesse quadro, a possibilidade de reestruturação da sua dívida.

Agora a discussão do acordo passou para as mãos dos chefes de Estado ou de Governo da Zona Euro, cuja cimeira já está a decorrer.


*


Os dados do problema grego são os seguintes:

  • 61% do eleitorado grego disse ‘não’ a medidas de austeridade no referendo de 5 de Junho;
  • 17 deputados do Syriza/Anel faltaram à votação no parlamento grego, abstiveram-se ou votaram contra as propostas de reformas — a maioria não calendarizada, nem quantificada, sublinhe-se — apresentadas em Bruxelas.

O governo da coligação Syriza/Anel ficou com o apoio parlamentar reduzido a 145 deputados na madrugada de sábado, perdendo por seis votos a maioria absoluta. É óbvio que o governo liderado por Tsipras, mesmo que tivesse intenção de implementar o pacote de austeridade, não tem apoio nem do eleitorado, nem do parlamento grego para cumprir o programa associado a um terceiro resgate.

Fazer um governo de unidade nacional com a Nova Democracia e o Pasok não está nos planos de Tsipras porque teria menos lugares de ministros, ministros suplentes e vice-ministros (mais uma peculiaridade grega) para distribuir pelo Syriza e pelo Anel, os partidos que formam o actual governo helénico.

Se o terceiro resgate à Grécia for aceite na cimeira de hoje dos chefes de Estado ou de Governo da Zona Euro, então há cinco Estados-membros — os três Estados Bálticos, Eslováquia e Portugal — que têm de receber imediatamente chorudos empréstimos do MEE, nas condições que forem concedidas aos gregos.

Para quê? Para estes cinco países poderem subir os respectivos salários mínimos e complementos sociais para idosos, de imediato, de modo a passarem a usufruir valores idênticos aos que forem fixados para os gregos, com os custos inerentes a serem suportados pelos restantes 13 países do euro, obviamente.

Esta medida é da maior justiça social: os salários mínimos da Estónia, Letónia, Lituânia, Eslováquia e Portugal são, respectivamente, € 390, € 360, € 300, € 380 e € 589. O grego é muito superior: € 684.

Além disso, estes países não devem ser obrigados a suportar um provável futuro calote grego. E mais: estes cinco países devem arrogar-se o direito de não pagar esses benévolos empréstimos, se os gregos não pagarem. Quem não se sente, não é filho de boa gente.


A opinião dos outros:

Ana Maria Cerdeira Queiroz @ Facebook

06:26
Claro, como sempre este sr. diz 'não' porque a Grécia agora tem um Governo que não é da sua cor com políticos que não despem as calças por isso têm de sair do euro. Bom era que todos os que estão dependentes destes alemães lhes virassem as costas e os deixassem sozinhos na UE, sempre queria ver o que faziam.

Ó maria queiroz, deves ser das que gosta de viver
10:27
com o guito dos outros. É muito bonito gastar à grande sem pensar em pagar. Além de que a Alemanha já provou a nível mundial ser produtora de grande qualidade em tudo que faz. Se não venderem a gentinha do teu tipo, vendem a pessoas sérias. Paga as tuas dívidas e não critiques quem é melhor que tu.

Criador de Touros
14:45
Schäuble é hoje a única referência europeia, a seguir vem Draghi, mas como é socialista, está submetido às pressões que aí andam da Internacional Socialista. Portanto Schäuble é a única referência de sensatez!
15:04
Quando o socialista francês Hollande diz que fará todos os possíveis para manter a Grécia no Euro, quer dizer — digo eu — que ele quer os gregos na Europa, nem que seja para os gregos darem cabo da Europa, como têm feito até aqui. É tolo o François.


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