domingo, 21 de dezembro de 2014

Estados Unidos e Cuba anunciam normalização de relações


Barack Obama e Raúl Castro anunciaram, em simultâneo, na passada quarta-feira, o início da normalização de relações entre os Estados Unidos da América e Cuba, cortadas há 53 anos:

17 Dez, 2014, 20:46


O presidente dos Estados Unidos reconheceu que o corte de relações não teve o efeito de defender os interesses americanos em Cuba.
O presidente de Cuba pediu que, depois de reatadas as relações diplomáticas, fosse posto fim ao bloqueio económico e agradeceu a intervenção decisiva do Vaticano dirigida pelo papa Francisco.

Antes dos discursos de reaproximação de Obama e Castro, Havana tinha libertado um espião norte-americano, Alan Gross, que estava em Cuba alegadamente ao serviço de uma agência de desenvolvimento, enquanto os Estados Unidos davam a liberdade aos três espiões cubanos restantes, de um grupo de cinco, que haviam sido condenados em 2001, depois da denúncia de um alto funcionário cubano.

O reatar de relações não significa o levantamento do embargo norte-americano a Cuba. O embargo só pode ser levantado por ordem do Congresso, que actualmente é dominado pela oposição republicana, tanto na Câmara dos Representantes como no Senado. O presidente pode anunciar o restabelecimento de relações diplomáticas e libertar espiões mas não pode sequer nomear o embaixador em Cuba, sem obter o acordo do Congresso.
Para já, vai haver um levantamento parcial do embargo das viagens dos norte-americanos a Cuba, que são proibidas neste momento. Haverá também o restabelecimento de relações bancárias, com a possibilidade de bancos norte-americanos instalarem caixas ATM em Cuba.


O embargo americano enraíza em acontecimentos ocorridos há mais de meio século:

17 Dez, 2014, 20:46

Em Janeiro de 1959, Fidel Castro conquistou o poder em Cuba depois de encabeçar uma guerra de guerrilha, durante dois anos, contra o governo repressivo e corrupto do ditador Fulgencio Batista que, a partir de 1952, estabeleceu relações com a máfia americana a quem entregou os negócios da droga, do jogo e da prostituição.

Depois de se tornar primeiro-ministro, Fidel de Castro visitou os Estados Unidos, procurando manter relações cordiais com a potência vizinha enquanto desenvolvia projectos sociais nos sectores da educação, saúde e infra-estruturas para melhorar o nível de vida da população cubana.

O governo era apoiado pelos camponeses, operários e estudantes, que constituíam a maioria da população do país, enquanto a classe média se deslocava para a oposição, com milhares de médicos, engenheiros e outros profissionais altamente qualificados a emigrarem para a Florida, nos EUA. Em consequência desta fuga de cérebros, a produtividade diminuiu e as reservas financeiras do país ficaram esgotadas em dois anos. A imprensa conservadora tornou-se hostil ao governo de Castro que decidiu prender centenas de opositores apelidados de contra-revolucionários.
Grupos anti-castristas financiados por exilados, pela Agência Central de Inteligência (CIA), dos EUA, e pelo governo da República Dominicana estabeleceram bases de guerrilha nas montanhas de Cuba, donde conduziam ataques contra o governo de Fidel de Castro. As forças castristas envolveram-nos em cercos cada vez mais apertados e fuzilaram sistematicamente os guerrilheiros capturados até à extinção dos grupos.

Em 1960, as duas superpotências — os Estados Unidos, uma democracia capitalista, e a União Soviética, um estado socialista marxista-leninista governado pelo Partido Comunista único — travavam a Guerra Fria. Fidel de Castro afasta-se dos EUA e defende claramente a visão ideológica da URSS, estabelecendo relações com os países marxistas-leninistas da Europa de Leste.

O presidente americano Eisenhower apoiou um plano da CIA para derrubar Castro que culminou, em Abril de 1961, já na época do seu sucessor John F. Kennedy, na invasão da Baia dos Porcos por exilados cubanos. Foram capturados pelas forças de Fidel de Castro 1.189 dos cerca de 1400 rebeldes que participaram na invasão, sendo 14 levados a julgamento, enquanto os outros foram devolvidos aos EUA em troca de 25 milhões de dólares de alimentos e remédios. Foi instituído o embargo económico e financeiro a Cuba.


18 Dez, 2014, 14:12

O anúncio do reatar de relações diplomáticas entre os dois países, nesta quarta-feira, foi comemorado por muitos cubanos que vivem na ilha, que tem uma população de 11 milhões, como o início de uma nova era para Cuba.


18 Dez, 2014, 14:18

Como era expectável, a notícia foi recebida com apreensão em Miami, nos Estados Unidos, onde vive a maior comunidade dos cerca de 2 milhões de exilados cubanos. Embora alguns pensem que vai provocar, primeiro, a abertura do regime comunista, e depois a sua desintegração, grande parte dos exilados considera-se traída pela administração Obama.
A cidade de Miami foi palco de uma manifestação de exilados cubanos que protestaram contra o governo de Raúl Castro e apelaram ao Congresso para impedir o levantamento do embargo a Cuba.

Já para os norte-americanos o fim do embargo representaria a possibilidade de criar negócios em Cuba, principalmente no sector do turismo, e poderia ter um impacto anual de 6 mil milhões de euros em exportações.
Em Washington, há quem considere que o restabelecimento das relações diplomáticas entre os dois países poderá mesmo levar ao desaparecimento de Guantánamo, a base norte-americana localizada em território cubano, para onde os militares americanos levaram os prisioneiros afegãos que nenhum estado americano quis receber.

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Começou o princípio do fim do embargo norte-americano a Cuba. Começou o enfraquecimento do regime castrista.
Raúl Castro sabe-o, mas reconhece que o socialismo já fez tudo o que era possível para melhorar o nível de vida da população cubana. Para ir mais além precisa de atrair empresas estrangeiras e reconciliar-se com a classe média cubana exilada nos Estados Unidos. Vai procura singrar a via chinesa: um país capitalista — tão ferozmente capitalista que só os empresários gozam do direito de propriedade privada através das suas empresas — governado por um partido comunista.

Mas não é certo que uma solução que funcionou na Ásia, vai funcionar na América latina. Um papa polaco acelerou a implosão dos regimes socialistas marxistas-leninistas da Europa de Leste, um papa latino-americano poderá desencadear a implosão do regime cubano. Não deixa de ser irónico.


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