segunda-feira, 23 de junho de 2014

Vão ser encerradas 311 escolas do 1.º ciclo no ano lectivo 2014-2015


O Ministério da Educação e Ciência (MEC) divulgou a lista das 311 escolas de 1.º ciclo que serão encerradas e cujos alunos passarão a estar integrados em centros escolares ou outros estabelecimentos de ensino com melhores condições no ano lectivo 2014/2015.

O processo foi conduzido pela Secretaria de Estado do Ensino e Administração Escolar, tendo por base propostas feitas pelos serviços regionais do Ministério, e foi realizado em articulação com as câmaras municipais, tentando sempre que possível encontrar consensos.

Para os alunos beneficiados, o novo ano lectivo terá início em infra-estruturas com recursos que oferecem melhores condições para o sucesso escolar. Estarão integrados em turmas compostas por colegas da mesma idade, terão acesso a recursos mais variados, tais como bibliotecas e recintos apropriados a actividades físicas, e participarão em ofertas de escola mais diversificadas.
Este processo permitirá também aos professores enquadrar-se no seu grupo disciplinar e contar com o apoio de outros docentes, disseminando as melhores práticas lectivas. Os professores opõem-se, em geral, a estas reorganizações da rede escolar porque diminuem o número de vagas a concurso e eliminam cargos com direito a suplementos remuneratórios.

Na definição da rede escolar do 1.º ciclo foram salvaguardas questões como a distância para a escola de destino e tempo de percurso, as condições da escola de acolhimento, o transporte e as refeições. Nos casos em que não foi possível garantir essas condições, foram mantidas em funcionamento as escolas em causa com uma autorização excepcional de funcionamento, ainda que ao abrigo da Resolução do Conselho de Ministros 44/2010 as escolas com menos de 21 devessem ser encerradas.

Segundo o comunicado do MEC, e tal como nos anos anteriores, para 2014/2015 os princípios que orientaram esta reorganização da rede escolar foram:

  • Garantir aos alunos, sem prejuízo do seu contexto local, uma efectiva igualdade de oportunidades no acesso a espaços educativos de qualidade, de forma a promover o sucesso escolar;
  • Reduzir os riscos de abandono e insucesso escolares, mais elevados em escolas com menos alunos, integrando-os em contextos educativos com mais recursos e de qualidade superior;
  • Proporcionar oportunidades de aprendizagem conjunta, trabalho de grupo, convívio social e troca de experiências, tanto a alunos como a professores;
  • Reduzir o número de turmas com alunos de diferentes anos de escolaridade, consolidando a organização pedagógica desejável;
  • Erradicar situações de isolamento de estabelecimentos de ensino;
  • Racionalizar a gestão de recursos, rentabilizando a dimensão e as condições de outros estabelecimentos de ensino, nomeadamente os centros escolares.

Trata-se de mais um passo num processo iniciado há cerca de 10 anos, continuado por este Governo desde o ano lectivo de 2011/2012 com bom senso e um olhar particular relativamente ao contexto.
Desde 2002, deixaram de funcionar mais de 6500 antigas escolas primárias. A reorganização arrancou no governo Durão Barroso (PSD-CDS) e incidiu, sobretudo, sobre as regiões norte e interior do país. Nos governos Sócrates (PS), com Maria de Lurdes Rodrigues como ministra foram encerradas mais de 2500 e com Isabel Alçada outras 700 escolas. Durante o governo Passos Coelho (PSD-CDS), o ministro da Educação e Ciência, Nuno Crato, encerrou mais de 500 escolas.

O processo de reorganização da rede irá prosseguir no próximo ano lectivo.


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Actualização em 29/06/2014

Intitulado “As crianças dão ânimo. Sem elas a freguesia fica mais sozinha”, este artigo do Público foca os problemas em torno do fecho das escolas:

A sua janela fica a poucos passos da Escola de Barreiro, na freguesia de Teixeiró, uma das 11 escolas que vão fechar no concelho de Baião. Ela, que sendo de cá até vive em Lisboa a maior parte do ano, já não vai poder dizer como dizia: “Da janela da minha casa na aldeia ouço as crianças no recreio”.

Não chegavam a uma vintena as crianças que todos os dias subiam este caminho até à escola. É feito de asfalto e pó, mas um carro sobe sem dificuldades. De um lado casas, com rosas nas soleiras; do outro, figueiras, ameixoeiras e videiras já com cachos. Em baixo, Aurora Macedo, que interrompe o trajecto para falar com os jornalistas, muito mais razões tem para lamentar. “A minha Inês ainda é muito pequenina para andar por lá o dia todo. Vai sair de manhã e voltar à noitinha.

Com sete anos, a mais nova dos quatro filhos desta mulher, frequentaria a Escola do Barreiro até ao 4.º ano, não fosse um decreto ministerial ter incluído este estabelecimento na lista dos 311 que, em 129 concelhos do país, já não reabrem portas em Setembro. “Aqui entrava às nove, saía às cinco e voltava para casa a pé”, conta Aurora. Se fossem cumpridas as orientações oficiais, Inês passaria a frequentar o centro escolar de Santa Marinha do Zêzere, a cerca de 16 quilómetros. Aurora não quer. “Eles dizem que põem um autocarro para levar as crianças. Mas e a gente?! Imagine que acontece uma desgraça e somos chamados à escola? Como é que chegamos lá?

Autocarros da rede pública a ligar as duas localidades não há. Chamar um táxi custa “de 20 euros para cima”. A solução encontrada por Aurora foi pedir a transferência da filha para uma escola do município vizinho, Mesão Frio. “Estamos aqui mesmo chegados. A câmara diz que vem buscá-los de graça e a gente precisando tem vários autocarros para lá durante o dia. E, se acontecer uma coisa de aflição, depressa nos pomos lá a pé: uma meia horinha.
(...)
Segue-se pela estrada principal e, poucas passadas depois, vai uma mulher na berma da estrada com duas miúdas no encalço, todas carregadas com vasos. Nem de propósito:

Foi a professora que mos deu. Como já não volta a abrir, as plantas iam ficar para morrer. Mete cá uma tristeza. É uma pouca-vergonha, isto. As crianças estavam aqui bem. Vinha uma carrinha trazer o almoço e, qualquer coisa que acontecesse, a gente punha-se logo na escola.

Célia Belchior, 28 anos, marido emigrado no Luxemburgo, não conduz. E quando lhe puseram a hipótese de transferir as duas filhas de nove e seis anos para Santa Marinha do Zêzere, respondeu que não. “É uma estrada ruim, perigosa”.

No Inverno, acontece a estas estradas que ziguezagueiam a serra do Marão, que ligam as pouco mais de 20 mil pessoas de Baião, ficarem interditadas por causa da neve e do gelo. No início do século passado nasceu aqui ao lado, em Gestaçô, Soeiro Pereira Gomes. Mas, como o escritor, muitos foram abandonando estas paragens. No último período censitário, entre 2001 e 2011, Baião perdeu 1500 habitantes.

Aqui o trabalho faz-se ao cabo. É sujo. O campo não dá nada”, sentencia Maria Rosa Mendes, que, entretanto, se junta à conversa. Tem 50 anos, galochas verdes, bata castanha. “No meu tempo, havia três professoras de manhã e outras três à tarde. Agora já se ouve dizer que vão fechar o centro de saúde. E empregos para os que cá ficam?”, indigna-se.

É Maria que aponta uma outra mulher, que, a algumas dezenas de metros, sulfata videiras.

Armandina Silva, 36 anos, foi auxiliar na escola, a troco de receber o rendimento social de inserção. “Limpava a escola, dava comida às crianças”. Foi dispensada. “Depois disso fiz uma formação para auxiliar idosos”. Longe de imaginar que dali a poucos meses a escola estaria a acolher velhos. “Há um pré-acordo com a câmara para transformamos o edifício da escola num centro de dia”, diz Leonido Ribeiro, presidente da União de Freguesias de Teixeira e Teixeiró.

Diz uma mulher de 50 anos: “No meu tempo, havia três professoras de manhã e outras três à tarde”. E a jornalista descreve a situação actual assim: “Não chegavam a uma vintena as crianças que todos os dias subiam este caminho até à escola”.

Em quarenta anos passou-se de seis para uma única turma. Menos de 20 crianças dentro de uma sala de aula onde eram ensinadas, em simultâneo, as matérias do 1º, 2º 3º e 4º anos de escolaridade. Crianças que acabavam por passar 75% do tempo a ouvir falar de assuntos que eram excessivamente complexos para as que estavam a começar a aprender ou demasiado elementares para quem já tinha idade de partir para o 2º ciclo.

A perigosidade das estradas cobertas de gelo no Inverno, a ausência de transportes a ligar as freguesias com o centro do concelho, a queda demográfica, a ausência de emprego, até a solidão de uma pessoa que passa a maior parte do tempo fora da aldeia são problemas abordados. Espantosamente, nem as mães, nem sequer a jornalista repararam na pobreza de conhecimentos e de desenvolvimento intelectual a que estas crianças estavam condenadas.

O recente relatório TALIS 2013 revelou que no 3º ciclo temos apenas 22,6 alunos, em média, por turma. Não será diferente a situação nos outros ciclos. Dar ênfase à afirmação da dona do café local de que as turmas têm 30 alunos é ignorância ou obediência servil a agendas ideológicas. Lamentável numa jornalista, qualquer que seja o caso.


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