sexta-feira, 24 de agosto de 2012

No rescaldo do julgamento de Breivik


Com a condenação à pena máxima de 21 anos de prisão renováveis, chegou ao fim o julgamento de Anders Breivik que massacrou 77 pessoas, em Julho do ano passado, nos atentados contra um edifício do Governo em Oslo e num encontro da Juventude Trabalhista na ilha de Utoya, perto da capital norueguesa.

Foi um julgamento impressionante.

Pela celeridade da justiça norueguesa e elevado comportamento dos juízes que, entre outras rotinas, cumprimentaram o arguido com um aperto de mão.

Pela arrepiante coerência de Breivik.
Tendo sido submetido a uma primeira avaliação médico-legal que lhe atribuía esquizofrenia paranóide considerando que não podia ser responsabilizado pelos seus actos, Breivik contestou. Numa carta enviada a um jornal norueguês, insistiu que os seus crimes foram "ideologicamente motivados" e preferia morrer a ser internado numa instituição psiquiátrica: "Enviar um activista político para um hospício é mais sádico e mais maléfico do que matá-lo!"
Na primeira audiência, em 16 de Abril deste ano, começou por saudar a assistência com um gesto conotado com a direita radical.
Quando lhe foi permitido falar, declarou à juíza presidente: "Não reconheço os tribunais noruegueses. Vós recebestes o vosso mandato dos partidos políticos que apoiam o multiculturalismo. Não reconheço a autoridade deste tribunal".
Confessou os ataques mas recusou quaisquer responsabilidades criminais pelos seus actos.
Pediu desculpa aos familiares das vítimas sem filiação política, recusando-se a fazer o mesmo pelos mortos na ilha de Utoya porque considerava que o massacre dos jovens políticos e de funcionários ministeriais foi "atroz, mas necessário".
Alegou ter agido em "legítima defesa (...) contra os traidores da pátria", apresentando o Partido Trabalhista como um “alvo legítimo” porque apoia a imigração e o multiculturalismo, políticas que poderão levar o Islão a controlar a Europa.
"Executei o mais sofisticado e espectacular ataque político cometido na Europa desde a Segunda Guerra Mundial. (...) Não tenho medo da perspectiva de ficar preso o resto da vida. Já nasci numa prisão onde não posso expressar as minhas crenças. Essa prisão chama-se Noruega", afirmou Breivik em tribunal, tendo acrescentado que agiu "em situação de emergência em nome do meu povo, da minha cultura e do meu país".

Nas alegações finais, a acusação a cargo dos procuradores do Ministério Público norueguês pediu que Breivik fosse internado numa instituição psiquiátrica. Pelo contrário, a defesa afastou o internamento psiquiátrico e pediu "uma pena de prisão o mais clemente possível" porque "a violência não foi o factor que desencadeou as suas acções, mas sim a sua ideologia radical".


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São realmente perigosas as ideologias radicais.

Regressemos ao final dos anos oitenta do século passado, quando foi criada uma organização fundamentalista islâmica — a Al-Qaeda — que pregava a guerra santa e treinava guerrilheiros em países muçulmanos, nomeadamente no Afeganistão e no Paquistão, para executarem actos terroristas contra interesses norte-americanos como, por exemplo, as suas embaixadas e consulados.

Aproveitando habilidosamente um desses ataques perpetrado em 11 de Setembro de 2001 contra as torres gémeas do World Trade Center — parece haver indícios de que até o maximizaram —, os Estados Unidos desencadearam uma intervenção militar no Afeganistão dominado pelos talibãs e principal foco da guerrilha.

Que, muito oportunistamente, estenderam ao Iraque, um país governado por um ditador pró-ocidental, tolerante em termos religiosos, não apoiante da Al-Qaeda e detentor de uma das maiores reservas de petróleo mundiais segundo a CIA. Com o apoio do Reino Unido, da Espanha e doutros aliados europeus.
Esta atitude foi trágica: acirrou o fanatismo religioso no mundo muçulmano e fez crescer exponencialmente a cruzada islâmica, agora estendida aos aliados europeus dos EUA na guerra contra o Iraque. Até os muçulmanos moderados se sentiram humilhados pela sociedade ocidental, de que abominam certos comportamentos decadentes — consumo de drogas, prostituição, pedofilia, pornografia, ... —, e regressaram a práticas culturais tradicionais que estavam a ser abandonadas, como o uso do hijab (lenço islâmico).

Se a cruzada islâmica existe, é preciso combatê-la.
Pegando em armas, ou procurando demonstrar, pela prática, a superioridade dos valores do mundo ocidental — o respeito pela vida humana, a igualdade de géneros, a defesa da biodiversidade, do multiculturalismo e da liberdade de expressão?

Os EUA perseguem impiedosamente os guerrilheiros e aprisionam, e até matam, os civis que sejam suspeitos como foi denunciado por Julian Assange.
Os políticos europeus procuram uma via mais fraterna, justa, tolerante e lembram que há muito aboliram a pena de morte. Mas nem sempre os actos estão de acordo com as ideias, há muita ganância e hipocrisia nos corredores do poder. E se há algo que os muçulmanos não apreciam é a mesquinhez e a dissimulação.
No entanto, do outro lado da barricada não há só qualidades, também existem defeitos ancestrais como a sensualidade, o autoritarismo e a violência. Além de que são detentores das maiores reservas de petróleo do planeta. E riqueza, por vezes, acarreta decadência moral.

Muitos europeus e muçulmanos vão sofrer e morrer neste embate entre as culturas ocidental e islâmica. Que vença o que cada uma tem de melhor.


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