quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Um oportunista político


No início de Outubro, António Costa afirmou que havia condições para desenvolver um trabalho sério com o PCP nos próximos dias para haver uma alteração da política em Portugal.


Negócios/Miguel Baltazar

07 Out, 2015, 20:24

O secretário-geral socialista reuniu em 7 de Outubro com os representantes do Partido Comunista Português (PCP). No final da reunião, António Costa afirmou que havia “condições para desenvolver um trabalho sério com o PCP nos próximos dias para haver uma alteração da política em Portugal”.

Quanto às divergências [entre o PCP e o PS] são por demais conhecidas e acho que nos devemos concentrar naquilo que é essencial que são os pontos de convergência, o que estamos a discutir não são os programas de cada partido, mas as medidas de política que são prioritárias para o nosso país para podermos ter uma inversão da política que tem sido até agora seguida”, acrescentou Costa.

Integraram a comitiva socialista o presidente do PS, Carlos César, os deputados socialistas Pedro Nuno Santos e Ana Catarina Mendes e o coordenador do cenário macroeconómico socialista, Mário Centeno.




Ontem, após o encontro com o Presidente da República, o líder do PCP reafirmou que António Costa tem condições para formar Governo e para governar com políticas alternativas à austeridade dos últimos anos.

Numa curta intervenção sem direito a perguntas, ao contrário do que aconteceu com os anteriores líderes partidários que foram recebidos por Cavaco Silva, Jerónimo de Sousa garantiu que há condições para uma solução de governação "duradoura", mas sublinhou que tal dependia das políticas que forem adoptadas, com a solução a ser "tanto mais duradoura conforme defender os interesses nacionais".
Entendia, por isso, que o Presidente da República não devia sequer indigitar Passos Coelho como primeiro-ministro.

No entanto, não esclareceu como estão a decorrer as negociações entre o PCP e o PS, quais as exigências concretas que os comunistas fizeram ou que tipo de solução estável estão dispostos a garantir.



Hoje, a Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública, afecta à central sindical do PCP — a CGTP —, começou a levantar o véu ao desafiar o PS, o BE e o PCP a aprovarem de imediato a redução do horário de todos os trabalhadores do Estado para as 35 horas.

"Fazemos esse desafio: tomem posse e façam a revogação da lei das 35 horas", disse Ana Avoila, a coordenadora da Frente Comum, na conferência de imprensa a seguir à cimeira que aprovou a resolução "por unanimidade" esta manhã.
"A revogação das 35 horas foi uma promessa do PS, do PCP e do Bloco de Esquerda", acrescentou, lembrando que independentemente do Governo que for formado estes partidos têm deputados suficientes para aprovar a medida.

O documento aprovado na cimeira da Frente Comum baseia-se numa lista de reivindicações que começaram a ser elaboradas no final da última legislatura, antes das eleições e da hipótese de um acordo à esquerda, e apresenta uma série de reivindicações, desde a reposição "imediata" dos cortes salariais à reposição do valor das pensões, passando pela reposição das 35 horas na administração pública e pela revogação "imediata" da sobretaxa de IRS.

Na conferência de imprensa, Ana Avoila esclareceu que há uma hierarquização das reivindicações:
"As questões que queremos ver resolvidas em primeiro lugar é o aumento dos salários, as 35 horas, o alargamento dos escalões do IRS e o descongelamento de carreiras, por esta ordem."

Apesar do documento aprovado determinar "a reposição imediata do valor integral dos salários, subsídios e pensões roubados desde 2011, incluindo as prestações sociais, bem como o descongelamento das progressões", Ana Avoila não afastou a hipótese de uma solução semelhante à que estará a ser negociada entre PS e Bloco de Esquerda: a da continuação dos cortes salariais nos primeiros três trimestres de 2016, com redução progressiva.
"Se em 2016 os cortes forem repostos nós ficamos muito contentes, porque não é mais que a obrigação que os governos têm. Se é uma ou duas ou três ou quatro vezes depois logo se vê, na altura de estarmos a negociar", respondeu Ana Avoila, quando questionada sobre a solução que está a ser negociada.

Embora não estejam afastados outros cenários numa futura negociação, para já a Frente Comum defende como primeira reivindicação não só a anulação imediata dos cortes dos salários mas também um "aumento de 4%, com um mínimo de 50 euros por trabalhador".


*


António José Seguro ganhou todas as eleições enquanto foi o secretário-geral socialista e António Costa, inebriado com a maioria absoluta que obteve em Lisboa nas autárquicas de 2013, lançou-se na corrida ao cargo com o argumento de que eram vitórias por “poucochinho”.
Esqueceu-se que Seguro era um opositor interno de José Sócrates enquanto ele pertencia à facção socratista: a função pública não lhe perdoou o corte de salários de Janeiro de 2011 e, nas legislativas de 4 de Outubro, Costa averbou uma derrota expressiva.

Na noite das eleições Costa era um político em situação desesperada. Mas não era um político desesperado. Não se demitiu para não pôr um fim na carreira política: nunca fez outra coisa, senão jogos políticos, nem sabe fazer mais nada.

Para ter maioria no parlamento precisava de juntar aos seus escassos 86 deputados socialistas, não só os 19 bloquistas, como também os 17 deputados comunistas. O PCP é um osso duro de roer devido à sua central sindical. Sofreu, porém, um rude golpe ao ser ultrapassado em número de votos e de deputados pelo Bloco de Esquerda, sendo relegado para quinta força política. É apanágio dos comunistas transformarem derrotas em vitórias e não fugiram à regra propondo um governo “de esquerda”.
Era justamente o que Costa precisava e acarinhou de imediato as ambições de poder dos comunistas. Afagou também os sonhos políticos dos bloquistas que fantasiam substituir o PS — tal como o Syriza esvaziou o PASOK, o partido socialista grego — e logo alinharam na mesma estratégia.

Costa, porém, é exímio em golpes traiçoeiros e vai devorar paulatinamente a actriz Catarina Martins e o economista teórico Francisco Louçã.

Primeiro vai satisfazer a exigência bloquista de reposição dos salários da função pública já no próximo ano 2016.
Se fosse uma medida viável do ponto de vista económico, durante a campanha eleitoral Costa teria prometido eliminar os cortes de José Sócrates, recolhendo de certeza os votos dos trabalhadores do Estado que votavam socialista mas, agastados, acabaram por cair no regaço bloquista. Não é. Agora, porém, a sua sobrevivência política é mais importante que a economia do País. Mercê da reposição dos salários na função pública, esses votantes vão regressar ao curral de Costa e ajudá-lo a ganhar as prováveis eleições legislativas de 2016.

Depois, quando os juros da dívida pública começarem a subir e o défice a descontrolar-se, diz que lamenta e repõe os cortes. Não foi a estratégia adoptada por José Sócrates, no ano das eleições legislativas 2009, com o aumento salarial de 2,9% dos funcionários públicos, seguido pelo corte de 5%, em média, em 2011, quando o dinheiro acabou e só os agiotas chineses lhe faziam empréstimos à taxa de juro de 6,7%?

Resta recordar que Seguro alertou Costa que era preciso controlar a fuga de eleitorado para a extrema-esquerda. Mas este rodeia-se de gente com a mesma falta de carácter dele. Carlos César é o socialista que rescindiu o contrato de compra do navio Atlântida, acelerando o fim dos Estaleiros Navais de Viana do Castelo. Ao aceitarem negociar com os actuais dirigentes socialistas, os comunistas deixaram transparecer que estão realmente desesperados. Pedro Nuno Santos é o deputado que se está "marimbando que nos chamem irresponsáveis" e que tem uma bomba atómica para usar na cara dos alemães e franceses que emprestaram dinheiro a Portugal. Alguém acredita que discursos destes atraiam investimento para a economia portuguesa?

A golpada pode não correr bem a Costa. O PS é um partido de centro esquerda e os eleitores do centro podem não apreciar as consequências económicas das jogadas de Costa com a esquerda radical e ir votar na coligação PSD/CDS em 2016. Mas não se pode ter tudo...

No entanto, o grande problema de António Costa é a formação de um governo estável no quadro do actual parlamento.

Um governo de Costa com participação do BE e do PCP é impossível porque estes dois partidos afastaram a hipótese de aceitarem um convite do PS para formar governo.

Se conseguir fazer um acordo no parlamento, Costa vai provavelmente esbarrar logo na etapa de aprovar o orçamento de Estado para 2016 porque o PCP é ferozmente anti-euro.
No âmbito da campanha para as eleições legislativas, Jerónimo de Sousa defendeu a saída de Portugal da zona Euro, apesar dessa medida obrigar a maioria dos estabelecimentos comerciais a encerrar portas e a lançar os seus trabalhadores no desemprego.
Medida que também impediria os portugueses de ter acesso a produtos que se tornaram indispensáveis na vida quotidiana — máquinas de lavar, frigoríficos, placas e fornos, televisores, telemóveis, computadores, automóveis, ... — e que só uma moeda forte como o Euro nos permite adquirir.

Jerónimo de Sousa afirmou à saída da reunião de ontem com o Presidente da República que há condições para uma solução de governo duradoura que será “tanto mais duradoura conforme defender os interesses nacionais". Esta frase sibilina começou a ser esclarecida já hoje com as exigências delirantes da coordenadora da Frente Comum dos sindicatos da função pública. Se o PCP insistir nesta via, o governo de António Costa será pouco duradouro...


A opinião dos outros:

Anónimo
21 Outubro 2015 - 11:59
Já se derem posse ao PCP ficamos todos a ganhar. Saímos do euro e vamos pró Alentejo cantar "Oh rama e oh que linda rama"... Trocamos os telemóveis pela enxada e ficaremos todos mais saudáveis.

Anónimo
21 Outubro 2015 - 12:26
Tanto quanto o PS, BE e PCP disseram, estão em "condições" para criar as "condições" para se criar um governo. O que quer dizer que não há um acordo, mas apenas intenções. Ou seja, estão a ser aldrabões e querem um cheque em branco.

Kolla
21 Outubro 2015 - 13:18
"Camaradas, a fome, a miséria é o resultado da política de direita deste Governo do Partido Socialista, camaradas! O povo exige uma verdadeira política patriótica de esquerda, camaradas!" Esta era a retórica estalinista do Jerónimo no tempo do Sócrates. Pelos vistos a pregação deu resultado: o Tó Costa converteu-se!

cslr4017
21 Outubro 2015 - 14:01
Francamente, até me custa acreditar que isto está mesmo a acontecer. Um partido como o PCP que só sabe estar na sociedade a falar em "derrota das políticas de direita, derrota disto, derrota daquilo...", ou seja, um partido que só sabe estar na oposição ser chamado a dar propostas de governação que são contrárias a tudo o que Portugal precisa e tem pela frente, francamente não entendo... A mesma coisa para o BE.
Será que quem lhes coloca o voto tem real consciência daquilo que faz?

Pontodevista...
21 Outubro 2015 - 14:26
Pode ser que seja uma perca de tempo ou não. Eu gostava de ver se todos os deputados do PS aprovam a moção de rejeição. Quero ver se os deputados do PS estão todos com o Costa, o oportunista (não consigo ver este homem como uma pessoa séria. Ele é do mais baixo que há).
Temos que saber se o PS actual é o PS do futuro e o que se pode esperar dele. Bastavam 9 deputados do PS não votar contra o orçamento para o governo não cair e a estabilidade não ser posta em causa.
Temos que ver se os interesses partidários prevalecem sobre os interesses nacionais. Se o governo cair, então que governe o PS e depois a ver vamos o que sairá... Ficamos é com a certeza que o PS em peso assim o desejou (para o bem e para o mal). Eu como português não quero saber dos políticos para nada, o que eu quero é que eles sirvam o país e não se sirvam dele.

Anónimo
21 Outubro 2015 - 15:47
Mas o PCP com 8% dos votos servirá para alguma coisa? Os 8%, número insignificante de portugueses, insiste em atrapalhar o rumo do país e vive em delírios e utopias. É tempo de correr com esta gente que tanto mal tem feito a nação. Emigrem para os países comunistas e deixem-nos em paz.

Luso
21 Outubro 2015 - 17:40
Sejam arrojados ó parasitários sorvedouros dos impostos de privados: proponham já 30, 25, 20 horas, não mais, mas atenção, igual no sector privado. Depois sentem no sofá observando o empobrecimento geral. Parabéns, chegaram a Cuba.

Rui
21 Outubro 2015 - 17:43
Ana Avoila para as finanças, já. A WORTEN já anunciou que irá fornecer as impressoras para imprimir os euros que irão pagar estas promessas. O regabofe está instalado. No fim, isto será tudo pago pelos do costume: o povo.

J. SILVA
21 Outubro 2015 - 19:21
Penso, que uma das importantes razões que levou o PCP a sugerir o acordo com o PS, foi a perda do poder que se estava a verificar nos sindicatos afectos à CGTP. Sentem o cheiro do poder e toca de imediato a atacar a exploração e a exigir os direitos da classe operária...

T
18:08
O amor é lindo... Este vai ficar conhecido como o "Outono da Esquerda", mas o problema é que a seguir vem o Inverno, provavelmente do nosso descontentamento...

CALMA, CGTP. MAIS DEVAGAR
18:17
Sou partidário do acordo à esquerda.
Porém, aconselha-se um pouco de contenção por parte da CGTP e que não queiram matar a galinha dos ovos de ouro, que é como quem diz não queiram passar do zero para mil com estalar de dedos.
Só darão argumentos aos pulhas da coligação.


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