Tribunal deu como provado crime de prevaricação de titular de cargo político da ex-ministra da Educação e de João Pedroso e determinou que indemnizem o Estado pelo prejuízo causado.
O Ministério da Educação celebrou, em 2005, um primeiro contrato no valor de 266 mil euros com o jurista João Pedroso para que procedesse à compilação de toda a legislação portuguesa da área da educação. Esta pasta estava, então, nas mãos de Maria de Lurdes Rodrigues. João Pedroso era irmão Paulo Pedroso, ministro do Trabalho e da Solidariedade num governo de Guterres. Apesar do serviço não ter sido cumprido, o ministério renovou-lhe o contrato.
Quando o caso foi divulgado pela comunicação social e se tornou um escândalo, a tutela considerou que o segundo contrato foi cumprido em apenas 50 por cento, tendo pedido ao jurista a devolução de 133 mil euros.
Em Junho de 2011, o Ministério Público acusou Lurdes Rodrigues pela prática do crime prevaricação de titular de cargo político, em co-autoria.
Foi igualmente deduzida acusação contra as pessoas de que a ministra se rodeou: Maria José Matos Morgado, a chefe de gabinete, João da Silva Batista, secretário-geral do Ministério, e João António Fernandes Pedroso, advogado e professor universitário, todos por co-autoria dos crimes de prevaricação de titular de cargo político.
Para a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa estavam em causa factos relativos à "adjudicação directa de vários contratos nos anos de 2005, 2006 e 2007 ao arguido João Pedroso, com violação das regras do regime da contratação pública para aquisição de bens e serviços".
O tribunal examinou um manual feito para as escolas no âmbito do contrato, tendo concluído que era “uma pequena obra bastante incompleta, sem originalidade nem interesse prático e contendo informações incorrectas, insusceptíveis de serem assumidas pelo Ministério da Educação”. Além de que já existiam colectâneas de legislação feitas pelos próprios serviços.
Não sendo João Pedroso um especialista nas leis do ensino, a dispensa do obrigatório concurso público foi motivada por afinidades pessoais e político-partidárias: todos os acusados tinham tido antes cargos de confiança em gabinetes governamentais socialistas.
Pedroso era, na altura, assistente da Faculdade de Economia de Coimbra em regime de exclusividade, encontrando-se dispensado de serviço docente para efeitos de doutoramento. Tinha, porém, uma consultoria com o Ministério da Justiça que lhe rendeu 118 mil euros, entre 2006 e 2008, segundo documentos incluídos neste processo. Talvez, por isso, não tenha conseguido entregar a compilação no prazo definido: no termo do primeiro contrato, em Junho de 2006, o grupo de trabalho de Pedroso “havia-se limitado a efectuar o levantamento e compilação de parte dos actos normativos, transpondo os dados coligidos nas bases do ministério para uma folha de cálculo Excel”.
Pedida uma prorrogação do trabalho, e também mais dinheiro, foi-lhe concedida, sem que a tutela tivesse invocado o incumprimento contratual. “Então o trabalho não era urgente?”, questionam os juízes no seu acórdão.
Os juízes descrevem a forma como foi "engendrado" um esquema de pagamentos destinado a evitar a publicação do contrato do advogado em Diário da República, de modo a subtraí-lo ao escrutínio público, “subvertendo-se a legalidade”. O tribunal dá ainda conta de eventuais ilícitos fiscais ao não ter sido encontrado, na contabilidade da sociedade de advogados de João Pedroso, registo de pagamento aos estagiários que o ajudaram a fazer a compilação.
O colectivo presidido pela juíza Helena Suzano realçou também a falta de verosimilhança e as contradições nos depoimentos prestados pelos arguidos em tribunal, para concluir que o seu único interesse era beneficiar o irmão do ex-ministro socialista, mesmo que para isso fosse necessário ignorar os “princípios da livre concorrência, legalidade, transparência e boa gestão dos dinheiros públicos”.
Lurdes Rodrigues tentou negar qualquer relacionamento pessoal ou partidário com os restantes arguidos, mas ficou comprovado que o seu companheiro, Rui Pena Pires, era sócio de João Batista na editora Celta.
Pelo tribunal passaram, como testemunhas abonatórias dos acusados, os ex-ministros da Educação Marçal Grilo, David Justino e Augusto Santos Silva. Todos confirmaram a necessidade da compilação ser feita e a falta de juristas no ministério para desempenhar a tarefa. O que não comoveu os juízes, que aludem ao “sentimento de impunidade que se faz sentir” na sociedade portuguesa relativamente a este tipo de criminalidade, “que mina o bem comum, a credibilidade nas instituições democráticas e corrói a justiça social”.
O colectivo de juízes condenou Maria de Lurdes Rodrigues a uma pena suspensa de prisão de três anos e meio e ainda terá de pagar ao Estado 30 mil euros.
João Pedroso e João Batista foram também condenados a três anos e seis meses de prisão, igualmente com pena suspensa. Vão ter ainda de pagar indemnizações ao Estado: o primeiro 40 mil euros e o segundo 30 mil euros. A chefe de gabinete da ex-ministra foi absolvida.
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Tendo leccionado em escolas primárias durante vários anos, Maria de Lurdes Rodrigues sabia que, depois do 25 de Abril, o ensino do 1º ciclo tinha-se degradado progressivamente ao ponto dos alunos pouco mais fazerem durante as aulas que pinturas e colagens. Procurou, por isso, impor um horário onde estavam reservadas algumas horas por semana para o estudo do Português e da Matemática que reputava, e eram, essenciais.
Havia decorrido, porém, mais de três décadas e os estudos de Lurdes Rodrigues na área da sociologia não eram suficientes nem para orientar uma reformulação dos programas daquelas disciplinas, nem para escolher professores de níveis de ensino mais elevados — do secundário ou universitários — capazes de proceder a essa reforma.
Entre os problemas estruturais do ensino, estava a medíocre formação dos professores dos 1º e 2º ciclos mas a ministra não tinha capacidade para avaliar o contexto e, muito menos, delinear uma solução.
Em vez de resolver estes problemas, criou o monstro burocrático, amplamente alimentado pela sua sucessora Isabel Alçada e, infelizmente, acarinhado por parte do professorado. Quando a formação é medíocre, as pessoas tendem a abrigar-se à sombra protectora dos relatórios copy&past...
Percebendo que não sabia como melhorar os resultados dos alunos nos outros níveis de ensino, Lurdes Rodrigues encetou uma fuga para a frente. Incentivou o facilitismo nos exames de Português e da Matemática do 9º ano e rodeou-se de pessoas dispostas a aldrabar os resultados dos exames nacionais. Fez furor na comunicação social uma directora regional de educação do Norte que defendia a exclusão dos professores classificadores que davam notas inferiores à média.
Avançou para um modelo de avaliação do desempenho docente, que pretendia rigoroso e baseado em resultados, sem ter implementado exames nacionais no final de cada ciclo de estudos. Rapidamente a Fenprof esvaziou os resultados e, do modelo, ficou apenas a inútil carcaça burocrática.
Criou um corpo de avaliadores — os famigerados professores titulares que seriam os detentores de todos os cargos nas escolas — através de um concurso burocrático que desvalorizava o ensino enquanto pontuava largamente os cargos exercidos nos últimos 7 anos da carreira. Tornou-se ridícula ao dar uma pontuação especial às funções exercidas na escola portuguesa de Moçambique onde tinha trabalhado.
Quando uma professora da instrução primária salta para professora do ISCTE, com o partido socialista a servir de trampolim, corre-se o risco de surgirem programas como o Novas Oportunidades. E, pelos vistos, pode perder-se as estribeiras e levar o Ministério da Educação a fazer contratos oportunistas em benefício dos membros da família política socialista.
O País está a mudar e a justiça começa a liderar essa mudança. Parece que só os políticos — Marçal Grilo, David Justino e Augusto Santos Silva foram testemunhar a favor da pior ministra da Educação de que há memória — ainda não entenderam este facto.
O Novas Oportunidades custou centenas de milhões de euros aos cofres do Estado em publicidade e em salários dos funcionários que passavam os diplomas. Lurdes Rodrigues foi condenada por um contrato ilegal de centenas de milhar, talvez o mais pequeno prejuízo que causou ao País enquanto ministra da Educação. São os azares do destino.
Não sendo possível julgar e sentenciar as opções políticas destrutivas motivadas pela incompetência e amoralidade da ex-ministra socialista, pelo menos a sua faceta amoral acabou por ser julgada em tribunal, através deste crime, e valer-lhe uma merecida pena suspensa de prisão.
Habituada à completa impunidade de que gozaram os políticos durante quatro décadas, ao “vale tudo” para chegar ao topo que ainda se pratica e se aceita no interior dos partidos políticos portugueses, Lurdes Rodrigues nunca conseguirá compreender a justiça da sua condenação.
Actualização em 1 de Dezembro de 2015
O Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) absolveu esta terça-feira a ex-ministra da Educação Maria de Lurdes Rodrigues do crime de prevaricação de titular de cargo político, pelo qual tinha sido condenada em primeira instância a três anos e seis meses de pena suspensa.
Segundo fonte do tribunal, o TRL considerou que "não houve dolo" na contratação do advogado João Pedroso, irmão do ex-ministro Paulo Pedroso, nem intenção de o beneficiar.
João Pedroso e João da Silva Batista (secretário-geral do Ministério da Educação), que haviam sido condenados a três anos e seis meses de prisão, igualmente com pena suspensa, foram também absolvidos esta terça-feira pelo TRL.
A fonte da Relação disse também que a decisão hoje tomada pelo TRL não admite recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.
Maria de Lurdes Rodrigues foi ilibada por um colectivo presidido por Cid Geraldo, presidente da secção da Relação de Lisboa que julgou o recurso da defesa, por Carlos Espírito Santo e por Maria José Machado (relatora).
A juíza desembargadora Maria José Machado é casada com Fernando Anastácio, candidato derrotado do Partido Socialista à Câmara de Albufeira em 2013, tendo participado em diversas acções da campanha socialista, em particular, foi fotografada no palco dos comícios da campanha ao lado de todos os candidatos do PS.
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