O que nos diz Alexandre Soares dos Santos, presidente do grupo empresarial Jerónimo Martins, sobre o pedido de ajuda financeira de José Sócrates? Que "vem muito tarde, muito tarde".
"Sabia-se há muito tempo que a situação económico-financeira de Portugal era muito má. E, quando se tem pela frente uma situação económica muito má, a única coisa que há a fazer é olhar para ela com seriedade e desenvolver um plano de ataque a essa mesma situação. E aquilo que se demonstrou ao longo deste tempo todo, foi que lançaram um PEC I, um PEC II, um PEC III e um PEC IV. Quando se lança PEC atrás de PEC significa que não há plano, significa que tudo é feito sobre o joelho, face às necessidades de tesouraria num determinado momento.
Evidentemente que isto só agrava o problema porque não atacamos, primeiro, o mal. Quando se nota a evolução da dívida portuguesa desde 2004 até hoje — em 2004 era 56% do PIB e hoje nem sabemos quanto é, há quem diga que é 92, mas há quem diga que é 140% — isto significa que nada foi feito e pretendeu-se fazer como a avestruz: meter a cabeça debaixo da areia e esperar pelo tempo melhor (...).
Criou-se à volta do FMI uma imagem de que a entrada dele é o fim deste país, quando a entrada do FMI é uma necessidade total. E porquê? Porque destruiu-se nestes anos todos a Administração Pública. Infiltrou-se, por todo o aparelho de Estado, incompetência, incúria e desleixo. E introduziu-se uma coisa horrível que foi a mentira. Lembra-se, em 2009, que nos disseram, em Agosto, que o défice era x e acabou por ser x, mais y e mais z? Não me venham dizer que, em Agosto, não se sabia qual era o défice, qualquer companhia sabe, em Agosto, quais são os resultados que vai ter no fim do ano.
Penso que vamos ter de negociar com o FMI e com a Comissão Europeia um plano de longo prazo de recuperação das Finanças portuguesas, porque há aspectos sociais terríveis no nosso país, neste momento, e não se podem ignorar. Um exemplo: tenho 1% da massa salarial do Pingo Doce penhorada pelos tribunais, de pessoal que não pôde pagar os seus compromissos e agora sou obrigado a entregar 30% desses salários aos tribunais. (...) Facilitou-se o crédito a esta gente para tudo: foram obrigados a comprar casa porque não havia arrendamento e agora, de um dia para o outro, vai-se-lhes buscar o dinheiro. (...)
Tem de haver um plano em que se recupere as Finanças porque sem Finanças sãs não há desenvolvimento mas, ao mesmo tempo, tem de se olhar com cuidado para os problemas sociais que este país está enfrentando e que nos podem levar a graves perturbações. (...)
Qualquer pessoa aceita qualquer plano desde que se lhe indique aonde esse plano nos vai levar e nós nunca fomos informados. Qual é o verdadeiro buraco das Finanças portuguesas? Há quem diga que não se podem fazer auditorias às contas. Qualquer pessoa na Comissão Europeia sabe exactamente qual é o buraco. Quem é que não tem direito a saber? O cidadão português. Paga os seus impostos e não tem o direito de saber como o seu dinheiro está a ser administrado e como é que o gastaram: isto é crime. (...)
Os juros altos vêm de não haver um plano que mostre aos credores para onde o país vai. Vai haver crescimento económico, ou não? Vai haver criação de emprego, ou não? Como se cria o emprego? Através do investimento. E como se cria o investimento? Através da confiança. E nada disto existe. A única coisa que existe é uma caça ao dinheiro para suprir as necessidades diárias do Estado. (...)
[Embora a austeridade inicialmente se agrave] temos uma certeza, o dinheiro vão-nos emprestar. Agora depende da capacidade que Portugal tiver em fazer uma boa discussão: demonstrar que somos credíveis, verdadeiros e temos um plano que vamos implementar. E isto impõe aos partidos que pensem em Portugal e não pensem uns em tramar os outros. (...)
Não podemos continuar neste adiar permanente de resolver uma situação grave. Tem que haver um acordo entre Presidente da República, partidos políticos e governo em relação às medidas que têm de ser tomadas e um compromisso solene de as implementar. Uma sociedade só compreende o que tem de fazer desde que a chamem a participar. Há uma medida urgente, têm de iniciar as negociações com o FMI, acertar no plano e ir implementá-lo. A seguir, começar a discutir aquilo em que o governo que saia das eleições deve ter o apoio dos outros, de preferência por uma coligação.
Tem de haver, antes das eleições, a mesma coisa que o senhor Dr. Mário Soares fez com o professor Mota Pinto: acordaram, antes das eleições, quem iria ser o primeiro-ministro e quais as medidas a tomar e respeitaram; o senhor Dr. Mário Soares foi o mais votado, foi o primeiro-ministro. (...) Penso que, em nenhuma solução o senhor Eng. Sócrates pode entrar, porque o senhor Eng. Sócrates, até hoje, tem mentido e um primeiro-ministro não pode mentir ao país. (...)
Porquê existe uma grave crise económico-financeira em Portugal? Porque há uma crise política há muitos anos, que gerou uma crise social. Desapareceram os líderes (...) que tinham sentido de Estado, que punham o País à frente dos próprios partidos. Então começaram as jogadas partidárias, começaram a aparecer partidos com quadros que, de experiência de vida, não tinham nada e se instalaram como ministros, secretários de Estado, assessores e engordaram. (...)
Estes anos já provaram que governos minoritários não funcionam. Zapatero teve a dignidade de dizer: "Não me vou candidatar mais". O Eng. Sócrates devia ter a humildade de dizer, neste momento: "Peço desculpa, vou-me embora". E o partido socialista devia ter a coragem de indicar um bom candidato a primeiro-ministro. (...)
Neste País, actualmente, gostamos muito de pôr as culpas nos outros. Nós não temos culpa nenhuma. (...) O que é que estamos a fazer de errado, cada um de nós? Um país é aquilo que a sua sociedade quer. Se cada um de nós, nas nossas funções, as desempenharmos bem, o país será bom. Temos de olhar para nós e perguntar: O que é que posso fazer pelo meu país? A sociedade civil portuguesa tem pecado pela inércia — os empresários, as associações empresariais, a banca, os sindicatos. (...)
Quando se vota, não sei em quem estou a votar. Voto num tipo que penso vai ser o candidato a primeiro-ministro, mas eu devia saber quem eram os candidatos a deputado. Devia ser obrigatório cada candidato a deputado publicar o seu currículo: o que é que ele fez na vida? Para saber se vale a pena votar nesse senhor. (...)
A CIP tem de deixar de defender interesses pequenos para passar a defender a iniciativa privada em Portugal, no seu todo, apresentando projectos. Passamos a vida a queixarmo-nos: os agricultores queixam-se, os industriais queixam-se, todo o mundo se queixa. Criou-se a ideia que o Estado tem de pagar tudo e nós não temos de fazer nada. (...) Se falar ao povo português, dizendo que o Serviço Nacional de Saúde tem que ser pago por alguns, não pelos pobres, as pessoas compreendem. O que não se pode é andar permanentemente a oferecer saúde grátis, escolas grátis, é tudo grátis, você só tem direitos, não tem responsabilidades. Temos de alterar profundamente a nossa forma de pensar e devemos manifestar o nosso desacordo, dentro da lei. (...)
Que tipo de país queremos, um país assente na iniciativa privada ou no Estado? Se é assente na iniciativa privada, vamos começar por alterar a Constituição, dizendo que a iniciativa privada é bem recebida. Quando fui para a Polónia, reuni-me com os advogados e pedi-lhes a Constituição polaca, a política fiscal e a Justiça. (...)
Se o País quer a iniciativa privada, então vamos adaptar as nossas regras e controlar essa iniciativa privada por reguladores, mas não nomeados por partidos políticos. Temos de encontrar um sistema em que seja gente competente, imparcial e conhecedora que vai desempenhar essas funções. Depois vamos vender o nosso País aos investidores estrangeiros. Adaptação das leis laborais: você tem direito ao trabalho, não tem direito ao emprego. (...)
[No que respeita aos projectos de investimento], a lei tem de ser muito clara: quer construir um hotel, sabe quais são as condições. Se não construir de acordo com a lei vai ser preso e o hotel vai abaixo. Responsabilizar as pessoas. Por que é que, em Portugal, há corrupção? A máquina burocrática é tal, que você tem de passar a vida a untar as pessoas ao longo do caminho. (...)
É uma pena que, para trabalhar, tenha de deixar o meu País, quando o meu País tem condições para ser um país a sério. Andamos simplesmente a brincar. A maior parte destes senhores que têm estado no governo deviam pedir desculpa, para não dizer mais, foi um crime o que eles fizeram. [As pessoas que decidiram contratos lesivos, nomeadamente nas grandes obras públicas prejudiciais] deviam responder em tribunal. Uns não falam porque não podem, outros não falam porque têm interesses, vivemos numa sociedade de medo. (...)
Quem tem que mostrar o caminho é o senhor Presidente da República que, neste momento, tem uma obrigação muito especial: forçar ao entendimento entre os partidos políticos para que apresentem à Nação um programa de recuperação e não dizermos que é uma fatalidade vir o FMI. Tem que chamar os três ou os quatro partidos a Belém, todos juntos, e dizer-lhes: meus caros amigos, têm que se entender e têm x dias para me apresentarem o vosso plano, antes das eleições. E se não apresentarem, deve informar o País e fazer um governo de iniciativa presidencial. (...) Deve forçar os partidos a garantirem que, qualquer que seja o resultado das eleições, há um plano acordado e devem cumpri-lo. E quando os resultados das eleições vierem, o mais votado será o primeiro-ministro."
07-04-2011
É o discurso de um Homem que criou uma carreira internacional sem protecção política, uma carreira internacional baseada no mérito.
É um Homem que se sentiu obrigado a regressar ao país para assumir a responsabilidade de gerir uma empresa familiar que ficou sem timoneiro.
É um Homem que construiu o segundo maior grupo nacional de distribuição alimentar e lhe deu uma dimensão internacional.
É um Homem que soube criar postos de trabalho para muitas famílias portuguesas.
Saibamos ouvir e reflectir sobre as ideias que transmite nesta entrevista ao Negócios da Semana, um programa da SIC. Ou preferimos continuar a ser o país mais pobre da Europa ocidental e a calcorrear o mundo a mendigar empréstimos?
O maior problema do país é o tipo de pessoas que consegue fazer carreira política em Portugal: incompetentes, irresponsáveis, demagogos e aldrabões.
Precisamos de varrer estas gentes, que atulham os partidos políticos e vivem à sombra do Orçamento do Estado, na administração central ou local e nas empresas públicas nacionais ou municipais, porque conduziram o país à insolvência.
Se os 3,5 milhões de abstencionistas das últimas eleições legislativas anularem o boletim de voto escrevendo "Queremos governantes competentes", o Presidente da República não terá outra alternativa, senão empossar um governo de iniciativa presidencial formado por estadistas.
Decidi transcrever parcialmente a entrevista porque muitos leitores não têm 50 minutos para ouvir as ideias do presidente do Grupo Jerónimo Martins que merecem reflexão.
ResponderEliminarNa SIC o vídeo tem imensos comentários e, num deles, pergunta-se:
"Será possível distribuir esta entrevista pelas universidades portuguesas? É que esta entrevista vale, no mínimo, por 10 aulas de gestão, 20 de economia e 1000 de cidadania. E já agora, à Assembleia da República, porque nunca é tarde para aprender e mesmo os mais burros têm direito ao ensino."
Não posso estar mais de acordo. E, já agora, alargar a distribuição ao ensino não superior: a Formação Cívica do curso diurno e a Cidadania do Novas Oportunidades são dadas por qualquer professor e, na ausência de preparação adequada, segue-se brochuras idiotas enviadas pelo ministério da Educação, com ilustrações de casamentos e festas multirraciais que a integração dos imigrantes é a grande preocupação do ME.
Bem melhor seria se os docentes passassem entrevistas desta categoria e promovessem uma discussão no final.
Soares dos Santos apresenta a solução para a crise política: um plano com as medidas necessárias para relançar o crescimento económico acordado entre os partidos com assento parlamentar e o líder do partido mais votado será o primeiro-ministro que vai implementá-lo.
E se os partidos não chegarem a acordo? O PR deve avançar com um governo de iniciativa presidencial. Sinto dificuldade em digerir os candidatos que propõe para primeiro-ministro, preferia um político que tivesse entrado em litígio com as práticas partidárias e não uma pessoa do sistema. Mas a solução é esta e tem a coragem de deixar transparecer certo incómodo com a passividade do PR.
Sendo o custo da energia um factor determinante na competitividade de uma economia, põe a nu a incompetência de Vieira da Silva nesta história:
"O transporte de rede em média tensão aumentou 40% para as nossas empresas em Portugal. O senhor ministro da Economia não sabia, não acreditou quando lho disse e tive de mandar a factura. Não respondeu."
Sim, vamos exigir que a democracia funcione, subscrever uma petição para que estas preocupações sejam lidas e faladas na Assembleia da Republica.
ResponderEliminarÉ também necessário que a voz dos Portugueses chegue à equipa negocial do FMI (temos que discutir como), para lhes fazer sentir que a estrutura de Administração do Estado está sobredimensionada e é essa uma das causas principais da inviabilidade financeira do estado, existem ministérios a mais, autarquias a mais, deputados a mais, viaturas do estado a mais, motoristas de gabinetes a mais, viagens e representações diplomáticas a mais, despesas de representação a mais……..Portugal é viável se não existirem tantos privilégios no Estado que não produzem nada nem têm nenhuma justificação!!
Caro Depoisdapoeira,
ResponderEliminarÉ difícil arrancar com petições por causa da inércia das pessoas, não se dispõem a ir buscar o bilhete de identidade a não ser que seja para abaixo-assinados visando objectivos de curto prazo. Por isso, quando um grupo consegue avançar com uma petição, há que ajudar a criar a dinâmica para esclarecer e mobilizar mais pessoas.
Mas o destino das petições é o arquivo. Veja-se o caso da petição sobre o Acordo Ortográfico que reuniu mais de 120 mil assinaturas, creio que atingiu o máximo de assinaturas de todas as petições. Foi enviada para a Assembleia da República, discutida numa comissão, os deputados fizeram um relatório onde diziam que haviam ficado sensibilizados para os argumentos apresentados e arquivaram.
Já as Iniciativas Legislativas de Cidadãos têm de ir a votação e, eventualmente, poderão ser aprovadas. O problema é que os projectos de lei devem ser subscritos por um mínimo de 35000 cidadãos eleitores, i.e. é preciso reunir 35000 cartas assinadas e, parece-me que, até hoje, só a ordem dos arquitectos conseguiu tal proeza.
Caro skeptikos,
Sou fã do blogue "A ciência não é neutra" (desde os tempos em que a imagem de perfil era um mapa de Angola e o fundo um velho papel de parede...) a que recorro sempre que preciso de informação técnica no domínio da energia eléctrica.
Um exemplo: este artigo, que pretendia esclarecer os leitores sobre as desvantagens da política energética do governo e os riscos financeiros que assumiu, tem um gráfico publicado naquele blogue.
O autor, professor associado do departamento de Engenharia Electrotécnica do IST, é um opositor feroz do lobby do "Eduquês" e tem uma multidão de seguidores.