A secretária de Estado do Tesouro e das Finanças foi hoje ouvida na Comissão do Orçamento, Finanças e Administração Pública sobre o processo de reprivatização do BPN. Na audição, que se prolongou por 2 horas, destacamos a sua intervenção inicial:
"Foi ainda o governo anterior que mandatou a CGD para dar início ao processo de procura de um potencial comprador para o BPN. Os prazos foram todos cumpridos e respeitados de acordo com o que tinha sido estabelecido quando foi tornado público esse processo.
As propostas foram recebidas na CGD no dia 20 de Julho, foram de imediato analisadas e durante a semana passada realizaram-se algumas reuniões para esclarecimento de elementos das propostas e negociação que culminaram no domingo, dia 31 de Julho, com a decisão do governo de entrar com o proponente banco BIC em negociações em fase de exclusividade.
Tendo presente a necessidade de dar tempo para os processos formais e legais exigidos para que se possa fazer a venda das acções do BPN, estimamos que no prazo de 6 meses todo o processo estará concluído com a transmissão das acções para o BIC.
Esta decisão recai sobre uma proposta apresentada por uma instituição de crédito autorizada em Portugal, e a operar em Portugal, e é a que garante a continuidade da actividade do BPN, que é um banco que continua em funcionamento na nossa praça, e a defesa dos interesses dos depositantes.
No que respeita aos trabalhadores do BPN, que era uma das nossas preocupações centrais, a proposta apresentada pelo BIC assume uma responsabilidade contratual de um mínimo de 750 trabalhadores e assume a rede integral de agências e centros de empresas com os trabalhadores a eles afectos.
Após a transmissão das acções, e no período de 120 dias subsequente, o banco BIC anunciou a intenção de proceder a uma reestruturação desta rede comercial que poderá conduzir ao encerramento de algumas agências, que levará ao despedimento colectivo dos trabalhadores afectos a essas agências ou centros de empresas, e o Estado suportará os custos associados à indemnização dos trabalhadores nesse procedimento de despedimento colectivo.
Existe, também, um conjunto de sociedades que foram criadas para a transmissão de alguns activos do BPN e que foram confiadas à Direcção Geral do Tesouro e Finanças.
Haverá mais alguns activos que vão ser transferidos para estas sociedades e a gestão destes activos que potenciam a recuperação de valores significativos para o Estado, será assegurada por um conjunto de trabalhadores do BPN que serão transferidos com esta nova vaga de activos.
Portanto o número de trabalhadores de que estamos a falar não é aquele mínimo de 750, serão os adicionais que o BIC decida vir a contratar e mais um conjunto de trabalhadores, ainda não fechado em termos de número, que será afecto à gestão dos activos (créditos, imóveis, participações sociais) destas sociedades.
A proposta de aquisição do capital social do BPN é de 40 milhões de euros e, no contrato que vai ser assinado nos próximos dias, o BIC vai fazer um depósito de caução de 25% deste valor e o remanescente será pago na data da transmissão das acções.
Foi ainda acordado que haverá lugar a um pagamento adicional a título de acréscimo de preço se, no prazo de cinco anos, os resultados acumulados da entidade consolidada BPN-BIC ultrapassarem 60 milhões, o Estado receberá o montante de 20% sobre esse excedente.
Considerando o esforço de recapitalização de 550 milhões de euros, valor ainda não fechado porque estão por definir os termos finais desta transacção, e o pagamento de 40 milhões de euros que o BIC vai fazer até à transmissão das acções, o custo para o Estado com o processo BPN ascende a 2,4 mil milhões de euros."
Nas rondas de perguntas e respostas que seguiram esta intervenção houve uma clarificação dos contornos do negócio e dos pormenores de cada proposta.
Vejamos o que Maria Luís Albuquerque disse sobre os outros proponentes:
"O Montepio não se propôs comprar o BPN, apresentou uma proposta para adquirir as agências do BPN, os depósitos e o sistema de pagamentos sujeito o valor a uma avaliação a fazer em momento posterior. Não se propôs adquirir o capital social do BPN, razão pela qual a proposta teve de ser excluída à partida por não preencher os requisitos daquilo que estava a ser colocado a concurso.
Havia uma proposta concorrente que apresentava o valor de 106,4 milhões de euros. Essa proposta desse conjunto de investidores não preenchia os requisitos necessários em termos de garantias de condições financeiras e de gestão. Propunham-se fazer um pagamento de 5% no final deste ano, em 30 de Dezembro, e fasear o remanescente do pagamento ao longo de seis anos."
E sobre o negócio:
"Os depósitos no BPN ascendem a um valor superior a 1,8 mil milhões de euros, como é sabido eram substancialmente superiores e têm vindo a diminuir desde 2008 e ao longo deste processo. Até ao momento da transmissão das acções haverá, potencialmente, uma evolução dos depósitos que só poderá ser conhecida nesse momento.
Relativamente aos activos, existe um montante de cerca de 3,9 mil milhões de euros, dos quais uma parte superior a mil milhões de euros, ainda não fechada, será transmitida para as sociedades [Parvalorem, Parups e Parparticipadas] e com essa transmissão adicional de activos serão também passados trabalhadores para fazerem a gestão desses activos."
Sobre os custos com a liquidação do banco:
"Se o Estado tivesse optado por um processo de liquidação, findo o prazo para encontrar um comprador para o BPN, o primeiro custo é que se teriam perdido os 1580 postos de trabalho.
Para além disso, os custos financeiros com uma estimativa de 1,5 mil milhões de euros porque haveria que fazer face aos pagamentos de todos os compromissos do banco.
É um banco em actividade, há, em primeiro lugar, um impacto reputacional sobre o sistema financeiro português pela liquidação de um banco que tinha sido nacionalizado. E depois tínhamos um conjunto de custos financeiros directos com impacto orçamental como é o caso das garantias que o Estado concedeu à CGD no âmbito de programas de papel comercial ao BPN e que, num cenário de entrada em falência, teriam que ser de imediato executadas e, como tal, teriam reflexo no OE ainda em 2011.
Depois haveria os custos associados com o despedimento da totalidade dos trabalhadores, a perda de receita fiscal e o reembolso a instituições de crédito que estão a proporcionar financiamento à instituição.
Em contrapartida haveria a recuperação de activos, nomeadamente créditos."
Registe-se, em particular, a intervenção do deputado Honório Novo que criticou a opção da reprivatização tomada, desde 2009, por PS, PSD e CDS e lembrou que havia uma alternativa, pondo, no final, uma questão sobre a negociação em curso:
"Era importante perceber se outras soluções não permitiam amortizar estes prejuízos e a longo prazo recuperar o prejuízo. E esta era a defesa da solução do PCP e que passava pela criação de outra marca, com outra gestão, actuando em núcleos de mercado muito próprios, por exemplo, quem o propunha era o Dr. Basílio Horta, fomento das pequenas e médias empresas, apoio à internacionalização, no sector público e numa actividade económica que, apesar de estarmos numa crise, continua a gerar lucros de dois milhões de euros diários, 400 milhões só nos últimos seis meses, é uma actividade potencialmente lucrativa e com os lucros permitia amortizar os prejuízos causados durante estes anos. Esta é a solução que o Estado devia ter adoptado.
(...)
Temos três veículos para os quais o Estado concedeu 3,1 mil milhões de garantias e 800 milhões de empréstimos da CGD. Para além destes 3,9 mil milhões de euros em empréstimos e garantias aos veículos, quanto é que a CGD mantém junto do BPN e como é que vai ser pago e se vai ser pago pelo comprador, seja ele qual for, BIC, Amorim, Angola ou Montepio é indiferente."
Graças a esta questão, ficámos a saber que:
"A CGD mantém no BPN dois programas de papel comercial que totalizam 1,4 mil milhões de euros e, se entrássemos numa liquidação, essas garantias seriam de imediato executadas e iriam ao défice.
Estes empréstimos estão incluídos no pacote de negociação com o banco. O programa de papel comercial de 400 milhões vai ser mantido na nova entidade, o outro será ressarcido com os activos do banco."
Na resposta a João Semedo ficámos a conhecer a causa da transmissão adicional de activos e que o Estado não deu novos avales para operações de financiamento via CGD nesta negociação:
"Disse que haveria um valor adicional a transferir para as sociedades superior a mil milhões de euros, mas sem concretizar. A razão é que o banco comprador pretende ter um rácio de transformação de 120% (rácio entre créditos e depósitos) — é o rácio que se comprometem a atingir os outros bancos a actuar em Portugal — e temos de ter em conta o valor dos depósitos à data de transmissão das acções. Daí que haja créditos a ser transferidos.
Não tem a ver com a qualidade dos créditos. A criação das sociedades, que foi feita o ano passado tanto que o efeito das imparidades já foi imputado ao défice de 2010, permitiu expurgar do balanço do BPN créditos com imparidades iguais ou superiores a 25%, criando a figura do ‘bad bank’.
Quanto aos avales à CGD, o montante mais significativo está associado aos activos que foram transferidos para as sociedades. E o objectivo, e a maneira como foi estruturado este ‘bad bank’ seguindo práticas utilizadas noutros países, é que a recuperação desses créditos permita pagar o crédito concedido pela CGD, não sendo necessário accionar a garantia do Estado.
Não há novos avales, nem novas garantias. O que referiu são garantias que estão associadas às sociedades que foram criadas e pelas quais respondem os activos que foram transmitidos e que estão em processo de recuperação."
Está prevista no OE 2011 uma verba de 500 milhões de euros para recapitalização do BPN.
Subitamente o governo, na pessoa da senhora secretária de Estado do Tesouro, sobe este valor para 550 milhões contra uma oferta de Mira Amaral de 40 milhões e retira mais de mil milhões de activos para o 'bad bank'.
Se o governo tivesse divulgado que estava disposto a entregar gratuitamente as acções do BPN, os depósitos, os melhores créditos assegurando à partida um rácio de transformação de 120% que os outros bancos se estão a esforçar por atingir, as melhores agências e oferecendo, ainda, ao feliz contemplado um prémio de, pelo menos,
550 – 40 = 510 milhões de euros,
temos a certeza que muitos mais esperançosos proponentes se teriam candidatado à mão da noiva.
Enfim, houve um conluio.
Continuação da história aqui.
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