domingo, 9 de setembro de 2012

"Quando vamos passar do plural para o singular?"


"Visaodiferente 07 Setembro 2012 - 15:31


É interessante ler os comentários e perceber que a culpa é sempre dos "americanos" que invadem outros países, dos "alemães e franceses" que colocam os pobres países do sul na pobreza, dos "especuladores gananciosos" que nos exigem juros "altíssimos", dos mercados, da Sra. Merkel, do FMI, enfim, de todos excepto de nós próprios.

Claro que provavelmente temos no bolso um telefone finlandês (Nokia), americano (Apple) ou coreano (Samsung), usamos roupa espanhola (Zara, Massimo Dutti) ou americana, viemos para o trabalho de carro alemão, francês, ou japonês, compramos electrodomésticos alemães ou asiáticos. Com excepção da cerveja e vinho nacionais (valha-nos isso), nós, portugueses, preferimos quase sempre produtos estrangeiros. Mas claro, a culpa de nosso empobrecimento, é deles, alemães e gananciosos que não nos querem comprar os nossos produtos. Produtos esses, que nem nós queremos.

Para ajudar, aproveitámos os juros baratos para construir estradas de luxo que não levam a lugar nenhum, estádios do Euro 2004 que estão às moscas, rotundas inúteis, jardins, pavilhões gimno-desportivos, ... O povo pediu, os políticos deram. Mas claro, a culpa da nossa dívida é de alemães e americanos que nos emprestaram barato e financiaram o nosso descontrolo. E claro, o BCE deveria nos dar mais dinheiro. O Sr. Seguro, líder do maior partido da oposição, acha que o BCE nos deveria financiar a juros de 1%. Mais dinheiro. Para quê? Para fazermos o que fizémos nos últimos 30 anos.

Por último, os "mercados", os "especuladores" aproveitam-se da nossa condição. Acho que alguém devia explicar ao Sr. Soares e ao Sr. Seguro que se eles, nós, comprarmos dívida portuguesa, se nós aplicarmos as nossas poupanças a comprar dívida Portuguesa, os juros baixam. Não existem "especuladores, mercados, seres malignos que agem em conjunto para nos delapidar, a nós, pobres Portugueses". Existem pessoas individuais, investidores, gestores de fundos que querem maximizar o valor para as pessoas que depositaram as suas poupanças com eles, que de forma livre, independente, decidem em que activos investir. E por isso mesmo as obrigações de Portugal a 5-anos subiram com yields acima de 20% e estão agora a níveis de 6%.

É sempre fácil culpar os outros e dizer que os mercados, os especuladores, os alemães, os americanos, eles, eles, sempre eles (mas quem são eles?) especulam contra nós, vítimas dos mercados.

Mas somos nós que, no nosso direito de voto, preferimos construir uma estrada do que financiar ciência, que preferimos dar terrenos a clubes de futebol em vez de apoiar exportações nacionais. Somos nós que compramos um carro alemão, em vez de andarmos de transporte público e pormos o resto do dinheiro em vinho português, em turismo rural. Nós portugueses desbaratamos dinheiro em consumo e maus investimentos em vez de o canalizar para investimento produtivo.
Podemos continuar a culpar o mundo enquanto descansamos tranquilos à sombra da árvore à espera que a maçã caia. Tenho dúvidas é que isso nos leve a bom porto.

Mas a boa notícia é que, pela primeira vez em democracia, no próximo ano exportaremos mais do que importaremos. Contra as melhores previsões da Troika, a nossa economia reagiu melhor do que o esperado. Pela primeira vez em democracia vamos viver de acordo com as nossas possibilidades. Cada um de nós, em vez de culpar os outros, deveria pensar no que pode produzir que interesse a esses outros. Temos de nos virar para fora, como fizémos há 500 anos. E acho que vamos fazê-lo bem.

Eu acredito no meu País e acredito que, quando deixarmos de perder tempo a culpar os outros e o aplicarmos a pensar em como vamos "descobrir mares nunca antes navegados", a nossa sorte vai mudar."


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