domingo, 9 de janeiro de 2011

Cavaco comprou acções da SLN a um preço mais baixo que os accionistas


Em Dezembro de 2000, a Sociedade Lusa de Negócios (SLN), dona do BPN, realizou um aumento de capital com emissão de 235 milhões de acções que, de acordo com a acta da assembleia geral de accionistas de Novembro a que o jornal Público teve acesso, ocorreu nas seguintes condições:

• 35 milhões de acções foram reservadas para os accionistas, ao preço de 1,8 euros por acção;
• 92 milhões de acções foram destinadas a uma lista de investidores, anexada à acta, onde figuravam Abdool Vakil, Dias Loureiro, José Roquette, e outros, ao preço 2,2 euros por acção;
• 108 milhões de acções foram destinadas a um conjunto de subscritores de acções ao preço especial de 1 euro, também identificados em lista anexada à acta, de que fazia parte Oliveira Costa, presidente e accionista da SLN e do BPN, e mais três sociedades instrumentais do mesmo grupo — a SLN Valor, a SLN Participações e a NextPart.

Na acta da assembleia ainda é referido que as acções adquiridas pela SLN Valor se destinavam ao projecto de admissão à bolsa da SLN e as da NexPart seriam subscritas por quadros, como prémio de desempenho.
Não se sabe a quem Cavaco Silva e a filha compraram as acções em 2001, desconhecendo-se também o mês e dia. Mas os accionistas não foram informados sobre operações de venda de acções por parte de algum accionista para satisfazer a compra de Cavaco e filha, como obrigam os estatutos, ao abrigo de um direito de preferência na movimentação de acções.
Portanto a venda ou foi ilegal — venda directa de um accionista sem a respectiva comunicação aos restantes — ou foi feita através de uma das sociedades instrumentais acima referidas que, de acordo com o artigo 7.º dos mesmos estatutos, estavam isentas de prestar informação sobre compra e venda de acções.

Um ex-accionista da SLN explicou ao PÚBLICO que Oliveira Costa atraiu, durante vários anos, muitos investidores para a SLN, através da venda de acções a um preço baixo, com a promessa de altas rentabilidades em poucos anos. "Da mesma forma que se ofereciam rentabilidades de 10 por cento em depósitos a prazo, a cidadãos desconhecidos, o antigo presidente oferecia rentabilidades anuais de 20, 30 ou 40 por cento a grandes investidores", explicou.
Muitos desses contratos foram reduzidos a escrito e tinham cláusulas de recompra, como será o caso denunciado anteontem por Paulo Portas. Outras promessas de rentabilidade eram meramente verbais, apesar da legislação de banca de investimentos exigir a sua redução a escrito. Não se sabe se o investimento de Cavaco Silva foi reduzido a escrito.

No entanto sabe-se, através do despacho exarado na carta de Cavaco, que Oliveira Costa autorizou a compra das acções pela SLN Valor, ao preço de 2,40 euros por acção. Como é que o ex-presidente do banco chega a este valor? Não se sabe. Mas é mais ou menos o preço máximo a que foram vendidas acções no aumento de capital de 2000 e até há vários contratos de recompra com valores que chegam aos três euros.
Anteontem, em declarações à TSF, Alberto Queiroga Figueiredo, actual presidente da SLN Valor e membro da Comissão de Honra de Cavaco, disse que, "para o que se praticava na altura", o valor pago a Cavaco estava "abaixo da maioria das compras", e admitiu a possibilidade de Cavaco ter solicitado a venda por ter "tido um feedback de que as coisas não estavam a correr bem".



Tal como o Público, o jornal Expresso também é da opinião que é muito mais provável que possa ter existido favorecimento no preço de entrada do que no da saída.


O PÚBLICO consultou as Declarações de Património e Rendimentos que Cavaco Silva entregou no Tribunal Constitucional, referentes à sua candidatura anterior (sobre rendimentos de 2004), entrada para o cargo de Presidente da República (rendimentos de 2005) e actual candidatura (2009).

Em Novembro de 2005, quando se candidatou, Cavaco tinha seguros de capitalização do BPN no valor de 210.634 euros.

Seis meses depois, ao assumir a Presidência, declarou possuir uma conta no BPN à qual estavam associados vários fundos de investimento: 483,310 unidades de participação do fundo Quam Multimanager 10%, 578,034 do Quam Multimanager 5% e ainda 817,140 unidades do SISF Euro Cash Enhanced Return Portfolio. De acordo com sites especializados em fundos de investimento, cada unidade dos Quam Multimanager valia, então, no mínimo 110 euros e, apesar de na declaração, preenchida à mão, o número de participações aparecer com vírgulas, o Público subentendeu que a ordem seria a das centenas.
A declaração mais recente, feita a 14 de Dezembro último, não tem qualquer referência ao BPN.

A análise das três declarações mostra que Cavaco Silva trabalha com quatro bancos — BCP, BPI, CGD e Montepio — e diversifica os seus investimentos. Tem, há vários anos, dezenas de milhares de acções da banca (BCP, BPI), EDP, Jerónimo Martins, Brisa, PT, Zon e Sonaecom, e ainda obrigações, milhares de unidades de participação de fundos de investimento, PPR no valor de 52.583 euros, depósitos à ordem no valor de 56 mil euros e a prazo no valor de 560 mil euros.
Mas declara dever "ao Banco de Portugal 14.421 euros fruto de empréstimo bancário".


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